terça-feira, 31 de agosto de 2010

POETAS

Isto de querer ser poeta
pode bem nada dizer
há os que acham uma treta
e não ter mais que fazer
nem saber bem o que quer

Quem vai compor poesia
com esforço irá tentando
na ideia de que quem cria
sem saber como e quando
lá acabará rimando

Mas também sem rima vai
usando seu versejar
pois o que mais sobressai
é o que fica no ar
aquilo que faz cantar

Só que o poeta em geral
não consegue que em vida
o achem ser genial
e só depois da partida
a fama lhe dê guarida

Poetas mortos há muitos
quantos terão produzido
em lampejos bem fortuitos
alguns graças ao Cupido
face a coração partido

Sentir a vida de frente
descobrir suas fraquezas
faz que haja alguma gente
sem esconder suas belezas
também cante as tristezas

Deixar em verso bem escrito
aquilo que na alma vai
é como quem solta um grito
que nem por isso atrai
quem do seu mundo não sai

Gavetas cheias de versos
à espera que alguém os leia
que saiam em livro dispersos
mesmo não sendo epopeia
mas que mostrem certa veia

Há editores valorosos
que acham que a poesia
não sendo só dos saudosos
exclusivo de valia
vão deixando que teimosos
possam ver a luz do dia

DESENCANTO POR ENQUANTO!




RECORDO-ME de ter participado, com José Carlos Ary dos Santos, numa dessas mesas em que. numa agência de publicidade, fazia parte profissional do “staff” o poeta Alfredo O’Neill, que foi o autor do “há mar e mar, há ir e voltar”.
Foi um período em que, por vezes se repetiam as discussões, os murros nas mesas, os gritos e até que, de repente, saia um “slogan” que era agarrado por todo, com grandes gargalhadas de satisfação.
Terá sido assim que surgiram centenas de frases que ficaram nos ouvidos de todo o Portugal e que constituíram a razão das boas vendas de artigos que as agências de publicidade propunham aos seus clientes. Os mais antigos ainda hoje se recordam de tantas dessas promoções, e não vou aqui repetir muitas de tais referências, ditas e cantadas, porque os novos nem têm ideia de que isso se terá passado cá na nossa Terra.
Vem isto a propósito de quê? Dos termos utilizados hoje quer nas rádios, na Imprensa e, sobretudo, nas televisões, e em que, na maioria das situações, os ouvintes ou espectadores não absorvem o produto que pretende ser dado a conhecer e ficam coma ideia estranha quanto ao que será que está a ser anunciado.
É o mundo de hoje, dirão. Pois será. Mas, afinal, para que serve gastar dinheiro em publicidade se os públicos que se pretende que sejam atingidos não conseguem entender, logo à primeira, o que está a ser, pelos vistos, divulgado?
De facto, num certo aspecto a publicidade não se situa assim tão distante do jornalismo propriamente dito no capítulo de que é necessário passar uma ideia aos possíveis compradores e nisso há que ser explícito e rápido na mensagem. É o que se passa com os jornalistas que têm mais queda para formar títulos dos artigos e chamá-los à primeira página das publicações. Um texto pode ser muito bem escrito, relatar convenientemente um acontecimento, mas se o leitor não é convidado a apreciá-lo através de um cabeçalho que lhe prenda a atenção, mas que – cuidado – não desvirtue o conteúdo, então metade da sua importância é perdida.
Atravessamos neste momento um período de má publicidade. É a minha opinião. Quantas vezes oiço e vejo repetidamente um anúncio e só fazendo algum esforço é que entendo o que é pretendido vender.
Será que isso só se passa comigo? Todos os potencialmente candidatos a serem consumidores do produto mal divulgado conseguem ficar esclarecidos?
Publicidade que tem de ser bem digerida para atingir o objectivo da sua criação, não é um convite é uma barreira que se cria entre um produto e os seus desejados clientes.

segunda-feira, 30 de agosto de 2010

MUNDO

Oh tu, que és Pai de todos
mas tratada com desprezo
por aqueles, os teus filhos
que te despejam os lodos
para aliviar o peso
e entregar-te sarilhos

É altura de vingança
de chamares a atenção
dos milhões que por cá andam
que é o fim de toda a dança
ou encontram a razão
ou do planeta desandam

Uns abanões p’ra mostrar
que não há sítio seguro
e fazer revolto o mar
com uns ventos a assoprar
com força a pôr tudo escuro
com casas a desabar

Os vulcões de boca aberta
a vomitar labaredas
queimando tudo à volta
já não há certeza certa
são muitas todas as perdas
anda a loucura à solta

Isso é só p’ra s’aprender
que quem manda cá na Terra
não é o Homem, coitado
se não soube obedecer
ao ter declarado a guerra
perde sem ser perdoado

És tu Pai Natureza
que não te deixas vencer
p’lo Homem, suas maldades
se respondes de surpresa
tens de fazê-lo aprender
que se pagam ruindades

O pior é se uma guerra
de um lado e doutro afinal
faz com que vá tudo ao fundo
e o que restar desta Terra
seja por bem ou por mal
represente o fim do Mundo




DESENCANTO POR ENQUANTO!...


NAS MINHAS frequentes passagens por livros já lidos noutras alturas, alguns bem digeridos, voltei um dia destes a pegar numa obra de Camilo José Cela, o Prémio Nobel de Literatura, espanhol, que usava uma linguagem livre, apaixonada, erótica, e a que alguns chamaram de desbragada. De facto, o autor também de um Dicionário de Erotismo, deixou uma obra em que não escondia a pretensão de chamar as coisas pelos seus nomes. Os nomes que ele lhes dava.
O único problema para quem não domina a língua castelhana, é que os seus escritos perdem toda graça e “salero” se não são lidos no idioma de origem, pela infinidade de frases e termos castiços que o autor utilizou a miúdo nos seus livros. E que não são facilmente traduzíveis.
Peguei agora num título seu, chamado no original “Cachondeos, escarceos y otros meneos”, de quase impossível tradução em qualquer língua, e deixei ficar na estante outro que adquiri há anos e que tem também um título muito sugestivo “Izas, rabizas y coliputerras” este dedicado às prostitutas de Barcelona, das Ramblas.
Por cá, mesmo recordando Bocage que utilizou, por vezes, uma linguagem também agressiva e popular, serão raros os autores que poderão assemelhar-se a Camilo José Cela, que foi membro da Academia da Língua do País vizinho e foi reconhecido com vários galardões de Espanha.
Porquê, então, eu me refiro, nestes meus desabafos, a um novelista, poeta e ensaísta que, não sendo muito popular entre nós, atingiu tão alto gabarito em todo o espaço de “habla castellana”?
Porque, numa altura em que se afirma por aí – alguns com evidente insatisfação - , que os espanhóis estão a entrar no nosso território, e sendo evidente que o idioma vizinho está agora a ganhar importância nos estudantes portugueses, especialmente porque certas universidades espanholas estão a receber alunos que vão daqui, já era altura de as edições dos dois lados vizinhos encontrarem forma de alargar as tiragens, com um mercado que aumentaria, espacialmente com nítida vantagem para as editoras portuguesas, que ganhariam visível subida de tiragens.
Mas esta afirmação é quase que uma blasfémia para muitos “aljubarrotistas” que ainda existem por aí. Há que esperar pelo caminhar natural das coisas, para que, a exemplo do velho Benelux, também possa surgir um dia uma Ibéria.
O futuro ditará as suas leis. E quem for vivo então, poderá verificar se se justifica que os velhos do Restelo continuem a proclamar que “mais vale só do que mal acompanhado”

domingo, 29 de agosto de 2010

CALÇADAS À PORTUGUESA

Pedras da minha calçada
que as piso todos os dias
elas são a minha estrada
mas fazem-me judiarias

Com os seus baixos e altos
nesta castiça Lisboa
temos de andar aos saltos
pois uma ou outra atraiçoa

Com essa mania atroz
da calçada à portuguesa
impõe-nos a todos nós
perder noção de beleza

E vistas pois bem as coisas
em época de magras vacas
se se usassem mais as lousas
bem se poupavam patacas

Neste País de esperanças
pois sempre tem sido assim
aguarda-se por mudanças
para as pedras terem fim

Ver de cócoras rapazes
a partir pedras na mão
uma a uma que nem ases
provoca grande aflição

Em covas lá vão metendo
nas ruas da capital
com pedra a pedra enchendo
sob as vistas do fiscal

Que na Baixa pombalina
haja calçada bonita
pode até ser coisa fina
e agradar quem nos visita

Mas pedras pela cidade
em ruas de lés-a-lés
tenham santa caridade
e lembrem-se dos nossos pés

Quando uma pedra se solta
e outra ainda além
tanto buraco revolta
não nos digam que está bem

Tenham pois pena de nós
poupem verba ao País
autarcas, oh todos vós
cortem mal pela raiz

Se estamos bem na Europa
não sendo mundo terceiro
é bom ver como se poupa
usando bem o dinheiro

Sem ter de pôr mais na carta
aqui deixo este recado
de pedras está já farta
esta capital do fado

Por um bairro pois comecem
a tirar o empedrado
e se chove não tropecem
na lama do chão cavado

ôr lajes de metro e meio
em vez de pedras à mão
transforma em bonito o feio
e torna direito o chão

Qualquer rua no futuro
terá o caso lembrado
um Presidente seguro
fez um trabalho asseado

Lisboa deixa de ser
um campo tão mal lavrado
fica assim um prazer
caminhar por todo o lado.

BENGALA


DETESTO QUANDO alguém que me encontre, na rua ou em qualquer outro sítio, não me vendo já há certo tempo me largue: “estás com óptimo aspecto!” Fico deveras entristecido.
É que aos novos, esta exclamação que pretende ser de elogio, não tem cabimento que lhes seja dirigida, pois o lógico é que estejam sempre com um bom ar jovial e de acordo com a sua idade.
Logo, essa expressão do se estar com bom aspecto o que é que quer dizer? Cabalmente, que nem parece a idade avançada que se tem. Que causamos a surpresa de não surgirmos caducos, carregados de rugas, curvados pelo peso dos anos.
O pior é que, da próxima vez que voltarmos a encontrar a mesma pessoa que antes evidenciou tanto espanto pelo nosso ar sacudido de muita idade, a diferença se notará em seguida. Pois tudo decorrerá com a naturalidade de quem tomou conhecimento de que lá virá o ar acabrunhado de quem já mostra exteriormente o peso dos anos.
E quando a bengala passa a constituir uma demonstração de necessidade de apoio, situação que só é necessário experimentar um dia para convencer como é útil tal instrumento, então o espanto dos outros, até dos vizinhos, provoca uma chamada à realidade de que o andar, sobretudo nas ruas de Lisboa que primam pelo ondulado das suas calçadas, ditas à portuguesa, representa uma chamada de atenção de que o que sucedeu aos outros também acabou por bater à nossa porta.
O tempo de vida provoca mudanças. E até apetecia regressar ao século XIX, na altura em que os cavalheiros circulavam pelo Chiado ostentando as suas bengalas de punho de prata, sinal não de velhice mas de situação confortável na vida.
Que bem que ficava o Eça com o seu porte de gentil-homem, segurando uma bela bengala que, obviamente, o caixeiro da esquina não tinha o direito de usar!...

sábado, 28 de agosto de 2010

TRETA

Isto de ser poeta
e ter de rimar
é quase uma treta
com as sílabas a contar.
P’ra mim poesia
é coisa que eu sinta
pode ser fantasia
mas faça que eu minta

Vou dar um exemplo
que escrevo e contemplo

Vejo o homem sentado no jardim
Num banco, sozinho
Ninguém repara nele
Nem ele próprio dá pela solidão
Ficou isolado no mundo
Já teve gente, companhias
Mas as tristes circunstâncias
Fizeram com que fosse o último
E ele aí está à espera
Que a sua vez também chegue

Afinal, este velho abandonado
Só se diferencia dos outros
Dos que têm gente à volta
Pessoas conhecidas, família, descendentes
Porque esses falam com ele
Até talvez lhe digam palavras bonitas
Irão provavelmente acompanhá-lo até à última morada
Distribuirão entre si o que sobrar do mais velho
Mas, no fundo, que outra diferença existe?
Só porque não estão com ele no jardim?
Está acompanhado sentado na sala?

Vou, pois, escrever poesia
com rima
com a possível mestria
mas olhando para cima
não vendo quem está ao meu lado
porque tudo é enfado





ESPECTÁCULO


JÁ ME TENHO referido ao uso e abuso e abuso de palavras e expressões que são introduzidas no falar dos portugueses e que, de uma forma geral, têm base na repetição feita por alguns intervenientes, especialmente nas nossas televisões e que, fazendo gala na tal insistência no uso que, por sinal, até lhes deixa alguma marca que se mantém durante um certo tempo, o que na verdade conseguem é espalhar vícios linguísticos que não acrescentam enriquecimento à nossa bela língua pátria. E essa do “espectáculo”, pronunciada por tudo e por nada, sobretudo não se enquadrando no tema ou no objectivo do que está a classificar, para além de enfastiante altera o verdadeiro significado do que representa o gozo de ver, ouvir e sentir alguma coisa que merece ser colocada num plano superior.
E não é somente esta expressão em alguns pretendem insistir e que, infelizmente até pega, pois esse também horroroso “digamos”, largado por tudo e por nada e que para o que serve é para estabelecer uma paragem no discurso que está a ser feito, dando a impressão que constitui uma ajuda para preparar o que é pretendido dizer a seguir.
Não é a primeira vez que aponto estes enjoativos “empecilhos” na língua portuguesa e se observo idêntico vício a ser perseguido por gente ligada à política, no Governo ou fora dele, então o meu desconforto ainda mais se acentua.
Gente que, embora devendo usar uma linguagem simples e que chegue facilmente a todas as camadas da população nacional – coisa que até geralmente não fazem, para se darem o ar de grandes sapientes - , mais razão têm para não seguir as calinadas linguísticas, pois que os exemplos devem vir sempre de cima. Como sucedeu antes e, menos mal, se está a perder agora, que foram os casos dos “portanto” e dos “pois”, que inundaram o palavreado dos faladores sem sentido.
Mas, voltando a essa do “espectáculo” e do “espectacular”, como também se costuma acrescentar, sou levado a admitir que se trata da situação que se atravessa no País que temos e que, devido aos comportamentos de certos homens públicos que nos deixam de boca aberta, conduzem a que o que é mau seja considerado como um verdadeiro número de representação, o qual espanta a quem ele assiste.
E, pelo mesmo motivo, devido à incapacidade que se demonstra por cá de chegar ao fim das questões que se situam na área da Justiça – e não só -, pois que não alcançam nunca um termo convincente, principalmente se se tratam de situações que envolve em figuras mediáticas, acredito que será daí que ressalta a expressão repetida do “espectáculo”
Só pode ser isso!

sexta-feira, 27 de agosto de 2010

AS DIFERENÇAS

Ser igual a qualquer coisa
a um quadro ou a alguém
sendo ideia apetitosa
a mim não me tem refém

Cada um é cada qual
com virtudes e defeitos
muito bem ou muito mal
pois não há seres perfeitos

O que marca é a diferença
que dá personalidade
e vem logo de nascença

Afinando com idade
pode dar parecença
mas total igualdade

DESENCANTO POR ENQUANTO!...

TANTO FICOU no ouvido dos portugueses esse tema cantado numa novela televisiva, que me surgiu a ideia de tratar de tal desabafo, como sendo uma questão fulcral no decorrer da nossa vida: o tudo e o nada.
Que comparação se pode fazer entre aquele que tem tudo, que vive rodeado de fartura material, que não sabe o que há-de acrescentar ao enorme espólio que foi criando ou que recebeu por dádiva ou herança, que é possível comparar com o outro, o que olha em volta e só contempla o vazio, a ausência do que tantos consideram essencial? São dois pólos opostos, duas condições de existência que se olham, de um lado com sofrimento, com resignação, pelo cheiro a pobreza que paira em seu redor, até com alguma revolta por não lhe ter calhado um percurso parecido com o do ricaço, enquanto que da outra parte se constata um enfartamento que, por vezes, embora não seja regra geral, provoca arrotos inestéticos e confrangedores.
Ambos, porém, são seres humanos. Não se distinguem senão no que mostram por fora. Estão sujeitos aos mesmos problemas de saúde, com a diferença única de que uns podem recorrer aos meios mais adiantados de cura e os demais entregam-se ao sofrimento e aguardam vez à porta do hospital publico. Mas, quando a doença é fatal, nenhum dos dois resiste, podendo apenas, os que dispõem de posses, aguentar mais tempo. A sofrer.
No entanto, alguma coisa em pleno percurso da vida os iguala. E, por muito estranho que isso possa parecer, a verdade é que se trata precisamente do vestuário. A moda tem dessas coisas e, por mais revoltante que seja confrontarmo-nos com um capricho que os ditadores da moda impõem, o certo é que as calças de ganga de marca e caras, a imitar as que os trabalhadores braçais antes usavam, essas calças, logo depois de serem adquiridas, levam uns golpes na zona dos joelhos, mostrando buracos esfarrapados, julga-se que para darem um ar de pobreza que diverte os que não se encontram nessa situação. Será ridículo, provocatório, até uma maldade, mas os que brincam ao parecer sem o ser, lá sabem o que fazem!
Mas não é só no aspecto exterior que se verifica a diferença entre os dois extremos. O espírito não está sujeito ao poder do dinheiro. A riqueza espiritual não está condicionada pelo poder de compra. Isto significa, claramente que o senhor dos anéis, de todas as preciosidades que possam ser acumuladas, não tem de ser, de forma alguma, uma pessoa de espírito rico. Se existisse um fiel da balança sobrenatural que vigiasse as fortunas exteriores e as que existem dentro dos indivíduos, se esse avaliador da justiça tivesse, realmente, uma acção purgativa, para evitar acumulações, por certo que não se verificaria o pior, que é o dos escassos em bens materiais terem, ao mesmo tempo, ausência de um espírito rico.
Já o contrário, a situação dos afortunados materialmente serem, simultaneamente, ricos de espírito, esta saturação não será tão fácil alcançar. Um espírito, pleno de virtudes, que não aceite que o seu portador humano se desfaça de todos os valores materiais que sejam excessivos, dividindo o que sobra para diminuir o sofrimento de parceiros, esse é, de facto, um espírito mais do que pobre, é mesmo miserável.
Um indigente da vida, se for possuidor de riqueza espiritual, se for compreensivo e não revoltado, se, apesar da demasia do nada, não invejar o que sobressai dos ricos, talvez carregue, por dentro do fardo da pobreza, aquilo que fará falta a muitos que esbanjam: a felicidade.
Aqui, o nada e o tudo fazem uma união. Não ter nada e ter tudo, como diz a canção que a miudagem andou a cantar em certa altura, sendo uma letra que se pegou aos ouvidos, pode não ser tão difícil de conseguir como parece à primeira vista. Difícil não será… pode é ser raro!



quinta-feira, 26 de agosto de 2010

CARACOL

Lentidão é defeito?
Talvez seja para uns tantos
para outros é preceito
oferece seus entretantos
depressa sendo ideal
também pode ser um mal

Caracol devagarinho
não precisa de ter pressa
vai seguindo seu caminho
não tem de cumprir promessa
a subir ou a descer
o que não faz é correr

Com os pauzinhos ao sol
da concha lá vai saído
pouco a pouco o caracol
andando não faz ruído
não se mete com ninguém
e quer que o deixem também

Mas o homem, o tal malvado
descobriu esse petisco
não o deixa sossegado
come-o em vez de marisco
por alfinete espetado
não considera pecado

Até sua própria baba
é descoberta recente
com as rugas diz qu’acaba
e a usa muita gente
quem diria anos antes
qu’era amigo dos pedantes

Há quem se esfalfe e que corra
p’ratingir o seu destino
com a pressa há quem morra
em completo desatino
o caracol bem ensina
que a pressa desafina

DESENCANTO POR ENQUANTO!...


TER ILUSÕES é ter uma espécie de esperanças. É sonhar com certa coisa de bom que se deseja ardentemente. É contar com o que virá no futuro. Porque ninguém aspira um amanhã desagradável. Não é normal que alguém ande iludido com um porvir que não corresponda ao que se aspira. Ter ilusões de que se consegue obter o amor de alguém, de que uma nova actividade desejada surgirá, de que a doença que nos atormenta ficará curada, no fundo, a ilusão é algo que transmite força para suportar os maus momentos.
Há, no entanto, que refrear as ilusões em excesso. Se são muitas, provocam cansaço. Sobretudo, pela espera que esses desejos inevitavelmente provocam. Chegar à conclusão que foi inútil manter uma ilusão, por vezes durante muito tempo, e de que o que aspirava não se realizou, é pior do que do que nunca se ter iludido. A mágoa de ter tido ilusões que se foram, que se perderam, é maior do que não conseguir iludir-se, de ser um conformado com a má sorte que não arreda pé.
Mas, percorrer uma vida sempre iludido, a pensar que tudo se resolve a contento, que o mal não quer nada connosco, podendo ser uma forma de abraçar à força a felicidade é, isso sim, viver em equívoco, andar enganado consigo mesmo e com o mundo que o rodeia.
Eu, por mim, já tive ilusões. Foram ficando pelo caminho. Também não estiveram presentes na minha vida de uma forma permanente. Tive dias. Dependeram das ocasiões. Acabaram por se desvanecer. Uma a uma. Chego agora à conclusão de que talvez me tenha iludido demais. Aspirei o impossível.
Se estou a escrever, como agora, e se não sustento a ilusão de que, numa dada altura, alguém lerá o texto que me sai da caneta, não vale a pena esforçar-me. Fico-me onde estou. Logo, neste caso, a ilusão é uma força. É útil mantê-la, para prosseguir na escrita. Se não admito que me pode sair a lotaria, não vale a pena comprar jogo. Quem perde é a Santa Casa. Se abdico da confiança de que um determinado remédio me pode fazer bem, ponho-o de parte.
Por isso, defendo o princípio de que, em certas ocasiões, é útil alimentar as ilusões. Só que devem ser controladas. Racionais. E não se devem manter durante muito tempo. Nem serem sempre as mesmas. Isso cansa. E quem espera… desespera!

quarta-feira, 25 de agosto de 2010

BRAÇO A TORCER

Se os homens fossem iguais
no pensar e no dizer
sendo até todos mortais
era grande o desprazer
opiniões diferentes
certo interesse provocam
e mesmo entre parentes
modos de ver não se tocam

É preciso é aceitar
aquilo que os outros são
cada um no seu lugar
quem sabe quem tem razão
por vezes nenhum dos dois
ambos estão enganados
e só tempos depois
descobrem que são culpados

Mas nem sempre se acusam
não querem dar a ver
do erro até se escusam
não dão o braço a torcer

DESENCANTO POR ENQUANTO!...


ASSISTO, com frequência, a pessoas que, a falar, acompanham a entoação da voz com gestos largos, movimentos de mãos, mexidas do corpo nas cadeiras e arreganhos de cara. Na televisão, então, é corrente assistir-se a esses bailados que pretendem dar forma às palavras que vão sendo ditas.
Daqui para ali, de um lado para o outro, desta forma ou daquela, de alto a baixo, são tudo frases que justificam, com alguma razão, o complemento do gesto. Mas utilizar expressões mímicas quando o que se está a dizer, pela sua simplicidade, não necessita de complementos gestuais, parece ser um excesso que só é usado por quem pretende dar nas vistas.
É verdade que os latinos, de uma forma geral, são bastante mais expressivos nas suas conversações do que os anglo-saxónicos, por exemplo. Logo, a origem dos conversadores tem influência na forma de comunicarem. Mas, mesmo assim, no seio das nações latinizadas, nem todos utilizam a expressão corporal para transmitirem o que têm para dizer.
Nunca perguntei a qualquer desses actores em potência, o motivo de não manterem uma compostura serena quando se encontram a “vender o seu peixe”. Naturalmente, perante este tipo de inquérito, os protagonistas ofender-se-ão, por estarem convictos de que não praticam tal exagero.
Conhecendo eu, da televisão, um ou outro destes gesticuladores, tenho para mim que haverá uma dupla explicação para tamanho exagero na movimentação manual e corporal. A de pretenderem mostrar-se mais aos telespectadores, com alguma ponta de vaidade acrescida; e a de considerarem que não serão suficientemente explícitos só com a palavra, pelo que recorrem a oscilações de braços, mãos e até do corpo, convencidos que ficarão de que, dessa forma, até os menos esclarecidos compreendem o que se lhes quer dizer.
Seja como for, quem actua rigorosamente às avessas, ou seja, aqueles que falam com voz monótona, mantêm as mãos sem movimento seja qual for o tema que estejam a tratar, que não despegam os olhos de um ponto fixo e não dão mostras da mais pequena reacção facial, esses, o menos que se lhes pode chamar é de serem uns chatos. Não estimula manter uma conversa com tais múmias.
Quer dizer: nem oito, nem oitenta. Tudo deve ter conta, peso e medida.

terça-feira, 24 de agosto de 2010

NÃO DEVO TER RAZÃO

Aquilo que nós pensamos
quando em tese insistimos
e depois nos admiramos
quando por fim consentimos
que afinal não é assim
que a razão não nos assiste
não vale fazer chinfrim
que a certeza não existe
ao chegar a esse ponto
dar a mão a palmatória
não fazer papel de tonto
e pôr fim na oratória
é o que se deve fazer
sair bem visto de cena
e com isso aprender
que teimar não vale a pena

E mesmo tendo razão
se o outro não a aceita
melhor oferecer a mão
porque amizade desfeita
só por uma teimosia
coisa que não vale a pena
pode ser que algum dia
noutra conversa amena
o assunto volte à calha
e quem antes discordava
já não faça de muralha
e com desculpa alinhava
e aí o que nos compete
é disfarce utilizar
em vez de deitar foguete
assobiar para o ar

As muitas vezes na vida
em que a razão é nossa
não tem de causar ferida
nem provocar qualquer mossa

Com cuidado e gentileza
mais vale fazer de tolo
porque mesmo com certeza
deve ao outro dar consolo

Não custa nada fingir
é como esmola ao pobre
no fundo é só repartir
e ter um gesto mui nobre

Já com dúvidas é pior
mais vale ficar calados
teimar é risco maior
dá azo a sermos julgados

Assim, prudência aconselha
em qualquer ocasião
ter sempre atrás da orelha
dúvidas sobre a razão

LÁ MUITO AO LONGE


SOU FORÇADO a interromper o período de descanso em relação à análise da situação política nacional, porque, por mais afastado que eu deseje estar em relação ao espectáculo degradante que nos oferece o panorama que nos é oferecido pelos profissionais dessa actividade que, digam lá o que disserem, constitui o modo de vida, aliás bastante abastada, de um elevado número de fulanos que se movimentam no ambiente em que se enfiaram e que lhes tem servido para satisfazer as suas ambições, repito, por muito que procure voltar as costas a tanta “sacanice”, lá chega o momento em que não resisto a surgir a público, neste meu blogue, pelo menos para desabafar o que vou acumulando no meu interior e que, se não o deixar sair, me faz correr o risco de explodir perante tantos e tão graves maus comportamentos que nos são dados observar por essas tais figuras que vivem à custa da chamada política.
Surjo agora porque isto dos tais políticos entenderem que as suas funções para bem do País é dedicarem-se a responder uns aos outros, maltratando-se mutuamente, utilizando expressões e utensílios de ataque verbal que se situam nas áreas das ofensas consecutivas, tal comportamento que é seguido, senão por todos é-o, pelo menos, pela maioria esmagadora desses participantes, o que constitui motivo para que as populações se afastem cada vez mais das linhas programáticas que deveriam figurar no topo de todas as causas. É certo que, nas manifestações partidárias que cada um dos grupos organiza, aqui e ali, um número elevado de participantes, empunhando bandeiras e gritando e repetindo frase já velhas de apoio, dão ideia de que, afinal, sempre existe muita gente que se coloca inteiramente ao lado de tais formações ideológicas, mas, se analisarmos o País por inteiro, o que ocorre na cabeça dos portugueses que, na maioria esmagadora dos casos, nem têm ideia do que o que cada partido pode e deve fazer, talvez possamos concluir que os poucos milhares de pessoas que, na maioria dos casos, são transportadas para um passeio com refeição oferecidos, concluiremos que esses sinais de apoio não passam de interesseiras presenças.
Mas, voltemos ao assunto que me levou a escrever hoje este texto: os dois partidos que mais se empenham em ocupar a plataforma governamental – que eu nem sei bem porquê, pois que a situação actual do País não é convidativa a assumir tamanha responsabilidade -, o PS e o PSD ocupam todo o seu tempo a denegrir a imagem do que se lhe opõe, o que, sob o ponto de vista democrático, significa uma autêntica demonstração de que, em ambas as partes, o espírito que se situa por detrás é o da ditadura pura e simples, pois que o não saber aceitar os pontos de vista que os outros defendem sem soltar logo com a maior agressividade que atinge a área das ofensas, isso é bem a prova de que ainda se encontra muito distante a prática natural dos princípios da Democracia, ou seja, embora cada um tenha os seus pontos de vista ideológicos, não é o permanecerem sempre de unhas afiadas para arranhar os adversários que faz com que se encontrem soluções para os problemas. Sobretudo numa altura destas em que não é com desavenças e provocações insultuosas que se consegue encontrar um caminho para tentarmos colocar Portugal salvo da catástrofe que está à vista.
Pretender, à viva força, vir a ocupar o lugar preponderante de um Governo não dá o direito de cada parte utilizar todos os meios para regatear o que pretendem, tanto mais que já se sabe que, após umas eleições e sendo um dos partidos o vencedor, o tempo que irá ser ocupado é o de acusar o perdedor de mau serviço prestado e de lástima pelas dificuldades em solucionar os problemas “são deixados pelo anterior ocupante do Executivo”. Somos peritos em criticar o passado, mas incapazes de resolver o futuro.
É sempre a mesma coisa. Quem toma posse é que é sapiente. Quem sai é o “burro”, com perdão para os tão simpáticos animais!...
O mal é que, nem daqui a cinquenta anos teremos políticos que consigam entender que é bom ouvir as opiniões mesmo dos adversários. Porque isso das Democracia é coisa que não se implanta por decreto e enquanto não for levada em consideração a opinião que já deixei aqui expressa por mais de uma vez, de que é urgente que, nos primeiros passos da educação escolar da nossa juventude, se inclua uma disciplina que, infelizmente, na vida familiar também não se pratica, a da prática democrática, a de saber ouvir e de respeitar as opiniões dos outros, mesmo que não coincidam com as nossas, enquanto tal não acontecer marcaremos passo neste nosso convencimento de que somos nós os melhores e os outros uns ignorantes.
Se, daqui a mais de cinquenta anos, este nosso País ainda der sinais de vitalidade, quem cá estiver e se lembrar do que tenho escrito, confirmará que a razão antes de tempo afinal sempre existe.

segunda-feira, 23 de agosto de 2010

CANSADO

Estou cansado do que fiz
do muito que já foi feito
ter querido o que não quis
levado coisas a peito
no fundo
confundo
o que neste mundo
é sempre segundo

Queria coisa melhor
ter vaidade numa obra
com a escrita ou pintor
mostrando arte de sobra
ser primeiro
de pé, pinheiro,
sem berreiro
bom viveiro

E se eu não me acredito
se ao alto eu não cheguei
o muito que deixo escrito
eu nunca renegarei
seja o que for
é suor
algum amor
muita dor

Mas a busca do talento
aquele que nunca fica
causa grande sofrimento
nem sempre se justifica
quem procura
com agrura
vive numa tortura
pode cair na loucura

Fatigado eu estou
mas se paro por momentos
já não sei p’ra onde vou
encontro outros tormentos
prossigo
castigo
afadigo
me obrigo

O que não quero é queixar-me
não vale já a lamúria
o que posso é castigar-me
rogar por génio com fúria
combater
querer vencer
e se perder
refazer

Chegado a esta altura
com tantos anos p’ra trás
este vício não tem cura
e mudar não sou capaz
aguentar
sem queixar
esperar
por outro ar

Cansado lá isso estou
p’ra isto não há remédio
eu sei bem p’ra onde vou
libertar-me deste tédio
então adeus
sonhos meus
enfiados nos seus breus
tapados por negros véus

DESENCANTO POR ENQUANTO!...


SE ANALISO o País que me calhou em sorte ser onde nasci e me confundo com a multidão para obter os serviços que a administração pública tem de proporcionar, mesmo ou sobretudo com a má vontade dos funcionários, pelo menos uma boa parte, deparo com as razões ou parte delas por que Portugal está tão atrasado em relação ao resto da Europa. E faço sempre o mesmo raciocínio: se esta situação mudar, vai levar tanto tempo que não acontecerá durante o resto da minha existência. Temos enraizado o gosto pelo complicado, pelas dificuldades que provocamos uns aos outros; se depender de nós tudo faremos para castigar quem aguarda pela nossa boa vontade.
Dizem, com ar sabedor, os que se conformam: as ordens vêm de cima! Mas, mesmo sendo assim, pelo meio os portugueses vão acrescentando ainda mais problemas aos que as instituições oficiais já por si estabelecem. Acabar com os carimbos, os triplicados, o preenchimento de impressos extensos, complicados e com perguntas desnecessárias, terminarem as filas perante um funcionário super-escrupuloso que não dá mostras de ter pressa e que sempre pede mais um papel que falta, tudo isto faz parte das vias-sacras dos naturais deste País, deixando a impressão de que se as coisas por cá fossem fáceis esta terra não teria graça nenhuma.
Perder uma manhã ou até um dia inteiro para conseguir resolver os castigos burocráticos, faltar ao trabalho produtivo por tal motivo, essa missão corresponde à sina de um verdadeiro português da silva. Como constitui um preceito deixar sempre para o último dia o que teve para fazer sem pressas durante largo tempo. Mas, afinal, não farão parte estas normais anormalidades da felicidade de um povo?
É isto que me faz pensar. Se, por artes mágicas, passassem os portugueses, de um dia para o outro, a ter tudo facilitado, a, por exemplo, como já acontece em Espanha e noutros países, ter um só número de cidadão que constasse em todas as dezenas de cartões de que tem de ser portador para provar quem é e, num simples segundo, poder ser atendido em qualquer serviço do Estado utilizando essa máquina hoje tão corriqueira que é o computador, se já acontecesse isso hoje entre nós tornar-nos-íamos mais felizes? Então o engraçado, o característico, o típico não é mantermos os hábitos ancestrais, os que vêm de épocas remotas, esses que os árabes solidificaram nesta Terra em que o fado, por mais que o modernizem, se conserva com um fundo mastigado de tristeza? Não será essa rotineirice que agrada a este povo que tanto medo mostra das mudanças?
Por isso, o ronceiro e lesma carro eléctrico, ao mesmo tempo tão prático por bastar conhecer-se os números das carreiras para se ser conduzido aos destinos dentro da cidade, o “amarelo” que obriga, por vezes, a formar longas filas à espera do próximo que, depois, não vem só um mas dois ou três seguidos, esse meio de transporte não pode desaparecer, por mais que avance a modernidade dos meios de transporte. As subidas e descidas para a Graça, para Campo de Ourique, para o alto da Ajuda não seriam as mesmas sem tais meios de transporte. Desde que surgiram no seu século e até hoje pouco mudaram. Só o custo dos bilhetes!...

domingo, 22 de agosto de 2010

O HOMEM PERFEITO

Tome-se um homem qualquer
a viver numa casinha
junto da sua mulher
com vida sossegadinha
de manhã para o trabalho
o almoço contadinho
o cabelo já grisalho
o fato bem compostinho
como todos passa os dias
sempre iguais mas não se importa
não tem nenhumas manias
e com pouco se conforta
seu cigarrito lá fuma
de leitura pouco gosta
de futebol sim, em suma,
e no seu clube aposta
um cafezinho à saída
com os colegas de luta
altura de uma bebida
e também de uma disputa
p’ra defender suas cores
e jogar no totobola
que aliviaria as dores
e descansaria a cachola
dava p’ra pagar ao banco
a hipoteca malvada
talvez abrisse um estanco
passaria a ter criada
mas se isso não se der
que é o que se tem mais certo
lá continua a viver
sujeito a todo o aperto
de chegar ao fim do mês
com a carteira vazia
que isso de rigidez
é tal e qual a azia
depois de uma almoçarada
como aos domingos se passa
dia de não fazer nada
e de gozar a madraça
pois o dinheiro não dá
para ter outra opção
p’ra além daquilo que há
e que é ver televisão
já que na segunda-feira
de novo o mundo rola
e quer se queira ou não queira
filho segue p’ra escola
a mulher vai trabalhar
o autocarro está
como sempre a abarrotar
mas outro meio não há
para ao serviço chegar
repete-se assim a cena
tem sido igual toda a vida
também não há que ter pena
basta esperar a partida
com certa resignação
a velhice não perdoa
as doenças também não
por tal não se gasta à toa
prevenir o amanhã,
os amigos vão morrendo
já é pouca a vida sã
o remédio é ir vivendo
com certa resignação
à espera do seu caixão.

Este é o homem modelo
o que nasce, vive e morre
que não sendo pesadelo
faz o que pode e lhe ocorre
não é muita a ambição
e de ter mais bem gostava
não sai do que está à mão
quando pode desencrava
sem ser muito resoluto
já que tem muitas cautelas
norma que lhe vem de puto
evitando as mazelas
e conservando os empregos
não mudando de patrões
já que os desassossegos
é que causam confusões
mais vale pouco que nada
dizem os mais cautelosos
caem sempre em borrada
os que são gananciosos
casado, muito calminho
com um filho que consola
não sendo um coitadinho
tem casinha pachola
nos arredores da cidade
e p’ra ser feliz já dá
não vive da caridade
quem quer demais sofrerá.

Mas ser assim comedido
não ter ambições na vida
justifica ter nascido
e andar por cá de fugida?
Resposta eu cá não tenho
nem quero ser eu juiz
por isso me abstenho
não sei o que é ser feliz.
Homem modelo é assim
nunca desejar de mais ?
Eu falarei por mim
nem todos são iguais
mesmo sem ter o talento
dos grandes homens de génio
há que lutar cem por cento
ainda que falte oxigénio

Com o filho já crescido
que partiu p’ra sua rota
manteve o seu apelido
e é um rapaz janota
os seus estudos lá cumpriu
até onde quis chegar
e a uma moça pediu
para com ele casar
o trabalho o afogou
tinha o destino traçado
uma casa pois comprou
com o dinheiro emprestado
começou tudo de novo
está visto, tinha que sê-lo
é essa a sina do povo
claro, do homem modelo

De vez em quando vem um
que sai daquele padrão
não sendo assim tão comum
juntos fazem multidão
alguns de cabeças espertas
os que fazem por passar
por portas semi-abertas
onde tentam se esgueirar
e quando conseguem ficam
à frente dos que esperam
e assim sempre debicam
pois são eles que aceleram
e de carro ou a pé
de cotovelo em riste
fazem o seu finca-pé
mas que é triste, isso é triste.
Os outros, que poucos são,
sobressaem da manada
nasceram com o condão
de deixar obra do nada;
são os génios, os tocados
pelo dom da Providência
serão os iluminados
na escrita ou na ciência
ou também em qualquer arte
com trabalho e muito empenho
são os chamados aparte
os que mostram ter engenho.
Só que a regra geral
é que os espertos enricam
acumulam capital
como o fazem não explicam;
os outros, os geniais,
quase sempre até morrer
mesmo sendo os anormais
não conseguem convencer
e só depois da partida
e até passados anos
é então reconhecida
a obra de alguns fulanos
com estátua em jardim
ou numa rua o nome
pagando-se assim por fim
a alguém que passou fome
É este o mundo que temos
em que o homem-modelo
mesmo que não aprovemos
é o que leva o selo
de cumpridor, direitinho
levando uma vida inteira
sem sair do seu caminho
sempre com eira e beira

Saudemos tal personagem
Prestemos-lhes a homenagem

Mas seguir o seu caminho
a mim não causa fascínio!












DESENCANTO POR ENQUANTO!...


Ter pena de alguma coisa, de alguém, de um ser vivo que atravessa um mau momento, sentir dor por tomar conhecimento de uma situação desagradável que aflige alguém por quem temos alguma amizade, essa sensação de desejar que as coisas não estejam a correr de forma sofredora é algo que, sem dúvida, constitui uma preocupação que pode surgir em determinada altura.
Mas essa sensação de ter pena não ocupa todo o tempo da nossa existência. Há momentos de ter pena. Como há ocasiões em que essa pena é obscurecida por outro qualquer sentimento, até pela alegria.
A pena é um sentimento que surge com a ajuda de diferentes verbos auxiliares. Pode-se ter pena, como algo pode fazer pena, ou uma situação dar pena como igualmente se pode sentir pena. Gramaticalmente é assim. Resta saber com que grau essa sensação actua no nosso interior.
Há quem acompanhe a pena com choro. Como há quem não transmita para o semblante o que será uma tristeza. Há quem tenha pena dos outros, de alguma contrariedade que sucede a terceiros, de um acontecimento que não corre de feição. Já ter pena de nós próprios não é tão vulgar. Termos pena de ser baixos, gordos, feios, carrancudos ou com quaisquer outras características, mesma as inversas, que sejam consideradas contrárias aos nossos desejos. Transportar esse peso de desgosto pode provocar tristeza.
Por vezes penso se alguém, alguma vez, teve pena de mim. Pena de não me ver deslumbrante de felicidade, pena por me contemplar no café, debruçado sobre folhas de papel, a preenchê-las com textos infinitos. Pena por não saberem quem é aquele indivíduo que, todas as manhãs, ocupa uma mesa, bebe a sua chávena cheia de café, vai despejando o copo de água aos golos e, sempre de caneta em riste, não pára com as suas escritas.
Deve ser um sonhador, pensarão. Alguém que descarrega no papel os desânimos da vida. Um pobre diabo que estará convencido de que verá um dia os seus trabalhos literários transformados em livros, admitirão outros mais próximos da realidade.
Será que esses que se interrogam terão, no fundo, pena de mim?
Seja como for, no que me diz respeito eu não atingi ainda – espero que tal nunca suceda – esse patamar de ter pena de mim. Penso somente que se estará a perder, por não ter acabado ainda este rol de desabafos que ando para aqui a debitar, alguma coisa que terá o seu valor. Por pouco que seja. E, por mais que não queira, como vou acompanhando aquilo que as editoras vão lançando com frequência, não podendo deixar de estabelecer comparações, mais razão encontro para não ter pena de mim. Terei pena de outros.
No entanto, neste momento dá-me para não hesitar em fazer esta afirmação: se não chegar o momento de saírem a lume estes textos, isso sim, É UMA PENA!...

sábado, 21 de agosto de 2010

JANELA

A janela para o mundo
é meu lugar preferido
posso ver tudo ao fundo
sem dar uso ao ouvido

A janela bem aberta
deixa entrar o bom ar puro
uma espécie de oferta
mesmo estando no escuro

Boa janela da vida
cá do alto tudo vejo
daqui tomo a medida
às vezes até invejo

Mas aqui estou defendido
das ruas, do reboliço
não me agride o alarido
pois não chega ao meu cortiço

Nem sinto os encontrões
que bem sofre o pedestre
bem longe das multidões
por isso me sinto o mestre

Mesmo assim algo me falta
p’ra que estar vivo eu me sinta
é ter o cheiro da malta
conviver com o tio Pinta

Esse que fala barato
tem graça e não ofende
ainda que às vezes chato
com ele algo se aprende

Mas desse e doutros tais
ponho-me sempre à tabela
quando não aguento mais
o refúgio é a janela

DESENCANTO POR ENQUANTO!...


Ando cada vez mais confuso. Por vezes chego a admitir que perdi a noção do que gosto, tantas são as contradições. E as distâncias que me separam daqueles que aplaudem aquilo que eu considero pouco suportável, esses afastamentos vão sucessivamente aumentando. Seguramente sou eu que ando enganado. Deveria talvez rever o meu sentido de crítica. Sujeitar-me à opinião de uma certa maioria. Ou, se não fazem parte do maior número daqueles que aplaudem, são, no mínimo os que mais se manifestam, dado que os outros encolhem os ombros e deixam andar. E essa, sim, constitui, de facto, uma maioria.
Refiro-me, com esta observação, a dois sectores que me despertam mais atenção: os livros que se publicam e as canções e os cantores portugueses que as interpretam. Todo o resto, e é muito, não cabe nesta apreciação.
No que diz respeito à literatura, por muito mal que me possa ficar sendo eu também alguém que procura intervir nesta área, arrepelo-me por constatar que um elevado número de edições é facultado a autores que, vindo sobretudo de áreas que beneficiam de uma projecção visual, suscitam o interesse de potenciais editores. Se alguém armou um escândalo de qualquer espécie, matou o outro cônjuge, foi autor de um roube de grande dimensão, teve intervenção num caso político que foi muito falado, se é proxeneta com imagem pública, ou “gay”, se é ou foi futebolista, pertenceu ao mundo do espectáculo, basta fazer constar que vai escrever um livro de memórias ou outro e logo fica descansado com o interesse que surge de um editor. E a promoção que é feita de seguida, com entrevistas e comentários, garante a venda de uns tantos exemplares.
No caso das cantorias, não é fundamental que as músicas e as letras daquilo que interpretam sejam razoavelmente audíveis, nem que as vozes que as propagam tenham um mínimo de qualidade. O que é preciso é que os chamados cantores ponham um certo ar de mistério na sua imagem, de preferência usem óculos escuros, não deixem entender as palavras que fazem parte do texto cantado e que, no capítulo da voz, a aparência do som seja mais semelhante a um arroto do que a qualquer melodia. Sendo assim, estão garantidas algumas edições de discos e convites para participar no que hoje, escandalosamente, se chama “concerto”.
Perante este panorama, controlo atentamente a rádio e a televisão. O botão para mudar as estações está sempre debaixo de olho. Eu defendo-me. Mas a verdade é que a confusão não me larga. Não há dúvida que não é a qualidade que ganha adeptos neste mundo que nos rodeia. Quero dizer, no País que é o nosso.
Ou será que, no fundo, sou eu que estou enganado?



sexta-feira, 20 de agosto de 2010

Não sou capaz de andar pelas ruas sem rumo.
De caminhar sem ter um destino.
Isso de dar uma volta nunca me suce
Se saio de onde estou é porque vou para outro sítio determinado.
Tenho um objectivo, um ponto estabelecido.
Nem que seja para depois regressar aonde estava antes.
E alguém tem alguma coisa com isso?


VELHICE


Que fazes aqui tu velho
sentado neste jardim
aguardas acaso o fim
farto de te veres ao espelho?

Olha que o tempo passado
bom ou mau, seja qual for
deves guardar com amor
e não apartá-lo ao lado

O que viveste foi vida
ninguém t’a pode tirar
o que se pode guardar
é sempre antes da partida

Há quem fosse mais feliz
que a sorte lhe não faltasse
mas talvez a quem amasse
vivesse noutro país

Conforma-te, pois, meu velho
que chorar não vale a pena
se a vida não foi pequena
deixo-te aqui um conselho

DESENCANTO POR ENQUANTO!...


Está dito e redito que Portugal é, cada vez mais, um País de velhos. Nem é preciso irmos propositadamente a uma terra do interior, a uma pequena aldeia seja onde for por esses campos fora, onde a juventude praticamente não existe, pois se nos sentarmos algum tempo numa rua de Lisboa ou do Porto ou mesmo de alguma das nossas cidades maiores a assistirmos ao movimento, para descobrirmos que o número maior de pessoas que passam é constituído por gente que deixou, há bastante tempo, de fazer parte dos homens de amanhã.
Dizem as estatísticas que o número de portugueses de idade é três vezes maior ao de novos. E isso quer dizer, entre outras coisas, que o futuro do nosso País está seriamente comprometido e que só contando com as crianças que nasçam entretanto, filhos de imigrantes, pessoas de outras origens e sem tradição lusitana, só concedendo a nossa nacionalidade a essas crianças de cores diferentes das nossas e de línguas e costumes paternos que não se assemelham aos que assumimos, apenas dessa forma será possível solucionar o escasso nascimento dos chamados portugueses de gema, o que, valha a verdade, até será possível que altere e melhore bastante a qualidade daquilo que somos hoje.
Como historicamente é sabido, aquilo que se pode chamar de características específicas dos portugueses surgiu de uma mistura de diferentes povos que, nos longínquos antanhos, resolveram vir instalar-se nesta Península e que, com as suas misturas em que interferiram os muçulmanos nos primeiros séculos da nossa era até à altura da sua expulsão, para além de franceses que, na sua invasão na zona das Beiras deixaram alguma marca, não esquecendo o que, no tempo de Afonso Henriques, surgiu da comunhão galaico-lusitana que, ainda hoje, constitui uma marca específica, este modelo situado nesta Península que, verdade seja dita, deveria ter grande satisfação (não gosto de usar a expressão orgulho) em ser bem diferente de todos os outros da Europa, nesta altura da vida e face às vagas de imigrantes que se instalam nesta ponta deveria cuidar de aumentar o rejuvenescimento das suas hostes, de forma a que não se confrontasse, daqui a poucos anos, perante a realidade de ver perdidas as ligações às suas origens.
Digo acima e reflicto sobre as consequências. Na verdade, perante os caminhos que têm sido seguidos no nosso País pelos maiores responsáveis da conduta nacional, face ao comportamento pouco recomendável, pelo menos dentro de portas, dos cidadãos portugueses, ninguém pode garantir que a introdução de sangue exterior no vaso que tem sido usado por cá não constitua uma melhoria que leve a que muito se altere no que diz respeito a levantarmos esta Pátria, com um passado histórico que muito nos honra, ao nível que nos deveria caber.
É mais uma esperança das muitas que acalentamos. E mais uma menos uma, não e por aí que se perde ou ganha alguma coisa. Toda a vida foi aí que constituiu a resistência que, a muito custo, conseguiu fazer com que tivéssemos chegado até aqui. Mal, mas vivos!



quinta-feira, 19 de agosto de 2010

Extasio-me ao contemplar os “convencidos da vida”.
São, a meu ver, uns felizardos de pacotilha.
Julgam-se os melhores naquilo que fazem.
Não são capazes de encontrar erros ou defeitos nas obras que produzem. Babam-se de gozo perante os elogios que recebem dos que calcorreiam os seus passos e se protegem com a sua sombra para conseguirem o maior número possível de benesses.
Pobres coitados?



SER POETA

Pergunto-me muitas vezes
mas fico-me sem resposta
mudo por dentro
seco de palavras
de explicações
porquê e para quê?
que resultado
para mim
e para os outros?
para que serve o poeta?
especialmente o sofredor?
não transmite alegria
não ajuda a encarar melhor a vida
a ser optimista
numa palavra
a gostar de estar vivo
passava melhor o mundo
sem poesias?
especialmente porque se sabe
que a prosa é mais apreciada
do que os poemas?
deixemo-los, porém,
continuar na sua rota de tristeza
amargurando-se
sentindo as palavras como pedradas
que ferem os seus sentimentos
a alma
o seu ser por inteiro
que estão sempre desagradados
com o que vêem escrito por si mesmos
os poetas não fazem mal aos outros
é a si próprios que agridem
contorcendo-se com as dores do irrealizado
insatisfeitos com o que os rodeia
maltratados por aquilo que sentem
tristes com o que não alcançam

Eu vejo-me assim
E bem gostaria de não ligar à poesia

DESENCANTO POR ENQUANTO!...



Quando releio as muitas centenas de poemas que já escrevi ( o que faço muito raramente) e que conservo em folhas soltas que, constantemente, se misturam, a minha vontade é fazer um molho desses papéis e despejá-los no caixote do lixo. Mas tenho, primeiro, que esquartejar todas as páginas, não vá alguém encontrá-las e depois exibi-las como obra sua.
Fico, porém indeciso. Será que não têm essas poesias, de facto, o menor valor? Que, bem seleccionadas, alguma coisa será aproveitável e supere a mediocridade?
Esta falta de confiança, que entra em mim quando remexo nos escritos de saíram da minha produção, a incerteza quanto ao valor que pode ter tanto trabalho, esse receio de poder ser considerado um intruso no meio literário obriga-me a encher as gavetas dos pendentes, sem coragem para oferecer à crítica, à opinião dos outros, alguma coisa que um valor tem, sem a menor dúvida: é tudo fruto de esforço, de empenho, de desejo em utilizar o tempo que me falta até ao passo final, deixando alguma coisa a que não assistirei qual vai ser o seu destino.
E assim, vou escrevendo prosa e poesia, da mesma forma que , de vez em quando, pego nos pincéis e encho uma ou outra tela de desabafos coloridos. E vou guardando tudo, ao ponto de não haver já muito espaço para armazenar aquilo que só eu sonho poder vir a ser apreciado um dia…
Não faço questão de assistir a esse surgimento.
Pode ser, no entanto, que com as novas técnicas que os computadores facultam, haja um disco que tenha sido utilizado para servir de arquivo. Pode ser.

quarta-feira, 18 de agosto de 2010

Extasio-me ao contemplar os “convencidos da vida”.
São, a meu ver, uns felizardos de pacotilha.
Julgam-se os melhores naquilo que fazem.
Não são capazes de encontrar erros ou defeitos nas obras que produzem. Babam-se de gozo perante os elogios que recebem dos que calcorreiam os seus passos e se protegem com a sua sombra para conseguirem o maior número possível de benesses.
Pobres coitados?

NUNCA FIZ

Aquilo que eu nunca fiz
não me serve de experiência
quando muito a imaginação
procura dar-me uma ideia
mas vaga
se bem que falsa e errada
não é a realidade
aquilo que é preciso
para levar a cabo
um trabalho
uma ocupação
que os outros têm ou tiveram
e que eu só ao longe
vislumbro

E como
analisando o mundo
reconheço que aquilo que eu fiz
foi uma migalha,
em relação ao mundo que se faz
tenho de concluir
que os meus conhecimentos
são ínfimos
o que quer dizer
que eu não sei, realmente, nada
e que tenho de reduzir-me
à minha insignificância
quando oiço cada um
dos que já fizeram isto e aquilo
falar sobre as suas experiências


DESENCANTO POR ENQUANTO!...


Por vezes, as estatísticas deixam-nos ficar desconcertados. Pode-se já ter uma ideia aproximada das situações, mas quando os números indiscutíveis surgem a lume, nessa altura caímos na realidade nua e crua e perguntamo-nos como foi possível ter-se chegado a tamanho extremo.
Isto vem a propósito de ter sido divulgada uma notícia de que o número de funcionários que trabalham para o Estado em Portugal atinge os cerca de 730 mil, o que equivale a dizer que se dispõe de um funcionário para cada 17 cidadãos do nosso País.
Ao comparar-se este ratio com situações idênticas na Europa – porque é sempre essa a equivalência que vale a pena fazer-se, dado que, também em tudo que se refere ao que ocorre no nosso País, pretendemos sempre colocar nos mesmo pratos da balança os valores de cada um dos parceiros que se encontram no barco europeu -, chegamos à conclusão de que nos encontramos, neste particular, também em posição deficitária. A Espanha, por exemplo, e dado que se encontra aqui ao nosso lado, conta com um funcionário estatal por cada grupo de 34 habitantes e a Alemanha fica-se pelos 28.
O confronto verbal que se tem mantido, entre sindicatos e organização estatal, em que os primeiros defendem que não há em Portugal excesso de trabalhadores a serem suportados pelo erário público, esse só terá fim quando um governo do nosso País passar das intenções para a realização do que se torna urgente e obrigatório fazer, que é a tal prometida estruturação de todos os serviços públicos que se encontram espalhados e que ocupam diferentes locais, uns de propriedade oficial e outros por aluguer de andares e até de edifícios completos, tudo situado em zonas distintas.
Enquanto não houver aquilo que em Madrid é uma realidade há um ror de anos, que é o chamado “Barrio de los Ministérios”, juntando numa só zona tudo que se refere a repartições do Estado e, anulando a anomalia de repetição de serviços com todos os custos que tal abarca (como seja o da duplicação e até triplicação de viaturas ao serviço de directores excessivos), enquanto isso não for cá feito não haverá forma de apurar, com absoluta certeza, se a prestação de serviços públicos é feita com o número exacto de funcionários e se a eficiência de actuação depende, na realidade, da falta de gente ou se não será por excesso de burocracia.
O sector jurídico aí está para tentar mostrar se o mau funcionamento dos tribunais se deve a falta de servidores nessa área ou a demasia de empecilhos criados pelos serviços e seus servidores.
Mantemo-nos e provavelmente seguirmos nessa via de não sermos capazes de enfrentar os problemas de frente é uma coisa.
Entretanto, nós, os que estamos vivos mas já pertencemos à craveira dos que não estarão por cá muito tempo para podermos apreciar as mudanças que são inevitáveis, não podemos fazer outra coisa que não seja ter esperança de que a rapaziada de agora e crescida dentro de alguns anos venha a ter a preocupação inevitável de reduzir gastos com os dinheiros públicos e, pelo contrário, investindo na melhoria do aparelho do Estado.
Entretanto, tem-se vindo a assistir a greves periódicas que uns tantos profissionais da manipulação de massas levam avante, para tentar conseguir um aumento de salários, isto é, o acréscimo de gastos de verbas públicas, extraindo-as de um saco que está bastante diminuído.
Vá lá ser-se prior de uma freguesia destas!...

terça-feira, 17 de agosto de 2010

FELICIDADE, O QUE É?

Quando me ponho a pensar
e a tentar entender
o valor do respirar
satisfação de viver
felicidade, bem grito
para que longe me sintam
com este ar de aflito
e com isso não desmintam
que é difícil alcançar
essa tão grata benesse
podendo então proclamar
que por vezes aparece
sendo assim é não largar
já que ela sendo rara
e que não é só amar
que por vezes a mascara
da ilusão do feliz
todo o mais esquecendo
e não ligando à raiz
do que se está vivendo

‘Inda bem que não se sabe
felicidade o que é
já que ao todo não cabe
por maior que seja a fé
em pleno no humano
e em qualquer condição
e nem mesmo por engano
ela se encontra à mão
ser feliz um dia sim
infeliz um dia não
isso acontece em mim
e me serve de lição
p’ra suportar os desgostos
de que é bem farta a vida
podendo ajudar os gostos
tudo antes da partida

Fico então a perguntar
se isso de feliz ser
se pode a alguém roubar
só porque nos dá prazer.
Assim a felicidade
cabe em mim na perfeição
basta que tenha vontade
p’rassentar no coração?
Que não, é a resposta a dar
cada um terá a sua
não há pois que invejar
a felicidade qu’é tua

Saúde, amor e dinheiro
dizem ser trio venturoso
qual deles o primeiro
já é tudo bem custoso
muita gente muito rica
do roubo tem muito medo
outra alarmada fica
do amor acabar cedo
a saúde essa sim
a todos é bem precisa
mas ela também tem fim
e sozinha é indecisa

A felicidade total
se alguém a tem neste mundo
encontrou o ideal
mas no fundo, bem no fundo
lá andará assustado
a menos que em consciência
não se haja ainda dado
conta de uma vivência
única, quase anormal
pois será até doente
a pedir o hospital
para tratar sua mente

QUEM NOS ACODE?


QUEM SE HABITUOU a ler regularmente este meu blogue já sabe que o optimismo doentio que paira em várias zonas do nosso País, sobretudo na área governamental com o José Sócrates à frente de tal pelotão, é desmentido pela análise que faço daquilo por que estamos a passar. E por muito que queira salpicar algum sal de boas perspectivas para o futuro, não consigo, honestamente, transmitir um mínimo de esperanças que levem a que crie um ambiente de boas perspectivas. Por isso, conforme tive o cuidado de informar, iria interromper, durante o tempo que considerasse suficiente, esses textos de que alguns leitores me acusavam de ser excessivamente pessimistas. E passei a dar conta de partes de um livro que tenho para publicar e que levará o título de “Desencanto por enquanto!...”, no qual incluo também alguma poesia da minha fornada, retirada da muita (são milhares) que tenho para um dia dar a conhecer.
Mas hoje abro uma excepção. Perante o andamento continuado que leva Portugal e em que não se vislumbra uma saída que, verdade seja, também não estará assim tão disponível no adiantado a que chegámos sem terem sido tomadas as medidas que se impunham há bastante tempo, volto hoje a interferir nessa área da desgraça que nos atormenta.
Pois é, nós que, com as nossas idades já não nos encontramos incluídos naqueles que, dentro de poucos anos, teremos de aguentar com o pagamento das dívidas e que, nesta altura, já nos cabe suportar a obrigação de ir liquidando os juros que, por sinal, não param de aumentar dia-a-dia, ainda seremos capazes de não tomarmos conta do que vai ser a limpeza geral dos nossos bens para fazer frente ao que gastamos e que é sucessivamente superior ao que produzimos. A não ser que, como tenho advertido há bastante tempo e que não tem sido levado na devida medida por aqueles que preferem viver no engano, as reformas que ainda estão a ser pagas venham a sofrer, primeiro, de uma redução percentual, e depois, face à carência de meios que o Estado enfrenta e vai ainda ter de encarar, se atinja o ponto de, sei lá, não poderem ser liquidadas. Já se falou recentemente nos dois meses superlativos que constituem uma norma e que, dentro em pouco, serão provavelmente eliminados. Por isso tudo, a juventude dos nossos dias, essa que, amanhã, vai ser a que receberá nas costas a “herança” que a actual geração lhe deixa, para além do desemprego que, nesta altura, constitui já um sofrimento que não se apresenta com hipótese de solução, essa camada de população irá revoltar-se contra os que, anos antes, não foram capazes de evitar que o pior lhe viesse a cair em cima. E sabe-se lá o resultado que advirá dessa recusa dos habitantes de Portugal. Tudo é possível suceder.
Não vou falar de números. Mas as contas, essas eu tenho-as feitas. E a conclusão a que chego e que contradiz a maldade dos governantes de agora que não têm a coragem de falar verdade aos portugueses, mostra-me – como sucede a outros cidadãos que até se apresentam perante as câmaras a escancarar as portas da realidade – que não existe desejo de cá ficar muito mais tempo a assistir ao terramoto que irá deixar sem solução o nosso País, e que o futuro que surgirá bem contribuirá para que choremos a História que, durante algum tempo nos séculos passados, nos colocou como exemplares nas descobertas, embora depois também revelássemos a nossa incapacidade em tirar daí qualquer proveito em nosso favor e até em benefício dos que lá nasceram.
E, ainda por cima de tudo isto, os fogos que, tendo sido de origem criminosa, como foram já declarados, se encontram há mais de uma semana a alastrar por todo o País, estão a acumular prejuízos e uma cada vez pior vida aos portugueses.
Este interregno no meu blogue é apenas para recordar que estou atento e que volto a deitar a mão ao meu “Desencanto por enquanto!...”, esse original que, também por parte dos editores que temos, está a aguardar que apareça nas livrarias.

segunda-feira, 16 de agosto de 2010

Os humores, provenientes das circunstâncias que se vivem, vão alterando os comportamentos.
É também o que se passa comigo.
Vou variando e ainda bem.

GÉNIO

Quem não tem génio e talento
e sabe que assim é
é um conformado
desconsolado

Quem não tem génio e talento
mas luta para os ter, sem conseguir
é um destroçado
um infeliz

Quem tem génio e talento
mas não acredita
é um desconsolado
um mártir

Quem tem génio e talento
e os outros o festejam
não sente nada
já está morto

DESENCANTO POR ENQUANTO!...


Tanto ficou no ouvido dos portugueses esse tema cantado numa novela televisiva, que me surgiu a ideia de tratar de tal desabafo, como sendo uma questão fulcral no decorrer da nossa vida: o tudo e o nada.
Que comparação se pode fazer entre aquele que tem tudo, que vive rodeado de fartura material, que não sabe o que há-de acrescentar ao enorme espólio que foi criando ou que recebeu por dádiva ou herança, que é possível comparar com o outro, o que olha em volta e só contempla o vazio, a ausência do que tantos consideram essencial? São dois pólos opostos, duas condições de existência que se olham, de um lado com sofrimento, com resignação, pelo cheiro a pobreza que paira em seu redor, até com alguma revolta por não lhe ter calhado um percurso parecido com o do ricaço, enquanto que da outra parte se constata um enfartamento que, por vezes, embora não seja regra geral, provoca arrotos inestéticos e confrangedores.
Ambos, porém, são seres humanos. Não se distinguem senão no que mostram por fora. Estão sujeitos aos mesmos problemas de saúde, com a diferença única de que uns podem recorrer aos meios mais adiantados de cura e os demais entregam-se ao sofrimento e aguardam vez à porta do hospital publico. Mas, quando a doença é fatal, nenhum dos dois resiste, podendo apenas, os que dispõem de posses, aguentar mais tempo. A sofrer.
No entanto, alguma coisa em pleno percurso da vida os iguala. E, por muito estranho que isso possa parecer, a verdade é que se trata precisamente do vestuário. A moda tem dessas coisas e, por mais revoltante que seja confrontarmo-nos com um capricho que os ditadores da moda impõem, o certo é que as calças de ganga de marca e caras, a imitar as que os trabalhadores braçais antes usavam, essas calças, logo depois de serem adquiridas, levam uns golpes na zona dos joelhos, mostrando buracos esfarrapados, julga-se que para darem um ar de pobreza que diverte os que não se encontram nessa situação. Será ridículo, provocatório, até uma maldade, mas os que brincam ao parecer sem o ser, lá sabem o que fazem!
Mas não é só no aspecto exterior que se verifica a diferença entre os dois extremos. O espírito não está sujeito ao poder do dinheiro. A riqueza espiritual não está condicionada pelo poder de compra. Isto significa, claramente que o senhor dos anéis, de todas as preciosidades que possam ser acumuladas, não tem de ser, de forma alguma, uma pessoa de espírito rico. Se existisse um fiel da balança sobrenatural que vigiasse as fortunas exteriores e as que existem dentro dos indivíduos, se esse avaliador da justiça tivesse, realmente, uma acção purgativa, para evitar acumulações, por certo que não se verificaria o pior, que é o dos escassos em bens materiais terem, ao mesmo tempo, ausência de um espírito rico.
Já o contrário, a situação dos afortunados materialmente serem, simultaneamente, ricos de espírito, esta saturação não será tão fácil alcançar. Um espírito, pleno de virtudes, que não aceite que o seu portador humano se desfaça de todos os valores materiais que sejam excessivos, dividindo o que sobra para diminuir o sofrimento de parceiros, esse é, de facto, um espírito mais do que pobre, é mesmo miserável.
Um indigente da vida, se for possuidor de riqueza espiritual, se for compreensivo e não revoltado, se, apesar da demasia do nada, não invejar o que sobressai dos ricos, talvez carregue, por dentro do fardo da pobreza, aquilo que fará falta a muitos que esbanjam: a felicidade.
Aqui, o nada e o tudo fazem uma união. Não ter nada e ter tudo, como diz a canção que a miudagem andou a cantar em certa altura, sendo uma letra que se pegou aos ouvidos, pode não ser tão difícil de conseguir como parece à primeira vista. Difícil não será… pode é ser raro!



domingo, 15 de agosto de 2010

Oxalá não deixe atrás de mim um rastro insuportável.
Mas, a minha única defesa é a resposta que deu Picasso a uma das suas mulheres, quando esta o acusou de ser mal disposto com os amigos e este lhe respondeu: “é que com os outros, não me interessa o que pensem de mim; nem me dou conta de que existem!”
Será uma desculpa. Cada um arranja a sua.

GAVETA

Gaveta que guarda
segredos de outrora
é coisa que tarda
‘inda não é hora
de querer abrir
p’ra não recordar
e ter de engolir
o que a guardar
e nmão sendo peta
ficou na gaveta

Era então desgosto
mazelas d’antanho
hoje é já sol posto
papéis não apanho
reler hoje em dia
o que então guardei
isso não faria
nem jamais farei
não abro a gaveta
não vou eu abri-la
falta-me a vontade
não quero senti-la
dar-lhe liberdade
outros que o façam
sem eu estar a ver
e que se desfaçam
não quero saber

Não estando presente
no mundo dos vivos
quem não vê não sente
nem dá mesmo ouvidos

Também não importa
não estarei p’ra ver
fechou-se a porta
que posso fazer?

Gaveta não puxo
falta-me a coragem
será mesmo um luxo
oferecer viagem
ao que há tantos anos
está encafuado
não causando danos
por estar olvidado

Não vejo agora
quem ficando cá
após minha hora
s’interesse quiçá
por ler o que fica
pois se enquanto vivo
não ligam nem nica
ao que é meu activo
de escrita, pudera,
que o outro se houvesse
seria quimera
seria benesse
bem apetecida
coisa que um poeta
ao longo da vida
não deixa em gaveta.



DESENCANTO POR ENQUANTO!


Andavam um dia destes a pretender avaliar qual seria o homem mais rico do País. Surgiram nomes e apontaram-se valores. Fizeram-se comparações com outros milionários estrangeiros. Os jornais reproduziram caras, publicaram biografias, fizeram elogios a quase todos. Cada um deles deve ter sentido aumentar o seu ego, mas, por outro lado, também terá feito subir a preocupação quanto à segurança, ao perigo de ver acrescido o risco de uma malfeitoria praticada por outros para obter avultadas somas por resgates.
O homem corrente, como é o meu caso, não lhe passa pela cabeça que um infortúnio destes lhe possa suceder. Não se volta para trás na rua para se assegurar que não é seguido e quando sai a porta de casa não se preocupa antes para certificar-se que não haverá caras patibulares nas redondezas. Muito menos contrata seguranças que o acompanhem para toda a parte e não lhe deixem um momento sem estar a ser observado.
Em certa altura da minha existência, dei-me a miúdo com um homem muito rico deste País. Foi uma circunstância que permitiu que eu frequentasse a sua casa, porque tinha a impressão que o fulano apreciava a minha companhia. E como só lia jornais desportivos, se bem que, por razões de aumento de património, se dedicasse a coleccionar obras de arte e tivesse comprado uma preciosa biblioteca de livros raros, os quais nunca tinha tido a curiosidade de folhear um deles que fosse, como não estava ao corrente das notícias mais comezinhas utilizava-me para o informar de viva-voz sobre o que se passava por aí.
Até que um belo dia se abriu comigo e largou-me esta frase: “Sabe, eu não tenho a certeza se as pessoas com quem convivo o fazem porque me apreciam ou se não será apenas porque eu sou rico…”
Recordo-me que reagi mal. Tentei pôr os pontos nos iis no que ao meu caso dizia respeito. Mas rapidamente recuperei a compostura e, a partir desse episódio, deixei de aparecer. Ele também não me contactou, estranhando a minha ausência. Quando morreu, passados tempos, não fui ao seu enterro. Parece que, com excepção dos filhos, poucas pessoas compareceram.
Afinal, o milionário que se finou não deixou nada feito por ele. O único mérito que teve foi o de guardar obras de arte e uma biblioteca riquíssima pela sua antiguidade. Depois de morto, valia tudo muito mais do que ele terá dado para ir acumulando tais preciosidades. Os herdeiros bem satisfeitos ficaram, por certo, em face do que foi guardado por intervenção de um antiquário que o aconselhou durante toda a vida e, com isso, também ganhou muito dinheiro.
Cheguei muitas vezes a pensar na enorme diferença que se constata entre os autores das obras de arte que constituem agora uma fortuna, todos eles, pintores, escultores e escritores que, seguramente, viveram com enorme dificuldades, e os elevados valores que representam agora os produtos dos vários génios que se foram acumulando apenas para irem aumentando o seu valor.
A diferença entre esses génios e o milionário que guardou as suas obras de arte, reside apenas no facto de terem os primeiros conseguido, depois de mortos, a distinção de ficarem famosos, respeitados, apontados como exemplo, e o homem que acumulou tais trabalhos, ter conseguido honrarias em vida mas, depois de morto, cair na obscuridade e não ser referido em qualquer manual de personalidades. É a vingança dos génios.

sábado, 14 de agosto de 2010

Crer ou não crer, eis a questão.
Se é preciso ver para acreditar, então o mundo inteiro é de descrentes.
Porque quase tudo que se conta, não se viu.
Ouviu-se.

FUTURO - UM MISTÉRIO

Cheguei a uma altura
em que ando pelo mundo
sem saber para onde olhar
já não me interessa a figura
nem procuro ver o fundo
para onde vou ficar

Para trás foi o que foi
já nada será mudado
não vale a pena lembrar
e se agora algo dói
o melhor é pôr de lado
e o futuro adivinhar

Mas futuro? Que mistério!
Nesta ânsia de escrever
acumular prosa e verso
já não é nada de sério
mesmo dando algum prazer
serve tanto como um terço


DESENCANTO POR ENQUANTO!...


Um saldo não se apura apenas nos documentos contabilísticos. Não é matéria exclusiva da economia e das finanças. Apurar o saldo de uma vida pode ser um exercício que, determinado a tempo, terá, eventualmente, capacidade de modificar o caminho que ainda faltar percorrer até ao fecho das contas.
Depois da morte, o saldo que os outros, os que ficam vivos, atribuírem ao finado, esse apuramento já o próprio não tem possibilidades de tentar melhorar. Mas, enquanto por cá se anda, se houver vontade de emendar os lançamentos, tentando melhorar o resultado definido até essa altura, se o tempo que resta ainda der para isso, se as circunstâncias forem favoráveis, se existirem condições positivas e, sobretudo isso, se se quiser, talvez seja possível dar uma posição mais confortável ao saldo que estiver ainda em equação.
O essencial é que as contas que fizerem os interessados em conhecer a diferença entre aquilo que fez de bem na sua vida e o que foi produto de uma actuação contrária, malévola, esse apuramento tem de ser fruto de uma análise sincera, honesta, límpida, imparcial. Caso se cometam erros de apreciação, se forem esquecidas parcelas que influem decisivamente nos resultados, se houver lapsos nos lançamentos, nesse caso o saldo apurado não corresponde à verdade dos factos. Haverá, então, que fazer estornos, lançamentos de rectificação.
Andar com as contas da vida todas baralhadas, não efectuar os débitos e os créditos no lugar certo, dá como resultado ficar-se permanentemente com o diário atrasado e não manter o razão com o devido acerto. Logo, o saldo não pode ser apurado.
Postas as coisas neste ponto, também me dá para efectuar o lançamento da seguinte interrogação: será que a vida tem de ser levada como quem pratica exercícios contabilísticos? O Deve e o Haver do percurso humano constituem a bússola para mostrar o caminho a seguir? É, de facto, esse o saldo que tem de ser levado em conta?
Para muitos, o que importa é apurar aquele que seja positivo, que não se situe no vermelho, que represente um resto que sirva para anular futuras dificuldades. São os calculistas, os prudentes, os que aprenderam bem a tirar a prova dos nove. Para outros, o que importa é que o referido saldo seja fruto de uma operação diária, que dê para o dia-a-dia, pois o amanhã é o depois. São os despreocupados, os que usam os dedos para fazer as contagens.
Hoje em dia, com o enorme número de reformados que recebe em dia certo a mensalidade que, na maioria dos casos, mal chega para aguentar as despesas do mês, essa massa de gente tem sempre o saldo apurado. Não é negativo, porque não há quem lhe dê crédito. E só é positivo porque o que falta é o que faz parte dos cortes no dispêndio, nos gastos que nem sequer são supérfluos. No fundo, apresenta sempre um resultado nulo.
Por mais que não se deseje, na linguagem do apuramento dos saldos vêm sempre a talhe de foice os números. Quanto sobra e o que é insuficiente. E, na área dos euros, dos dólares ou de qualquer outra moeda, são os quantitativos que importam. Quando, afinal, o saldo que deveria interessar aos homens tinha de ser o resultante das boas e das más acções, ou seja o apuro final no capítulo das desavenças, entre pessoas, entre países, entre posições políticas, religiosas, sociais, entre tudo que são as causas de guerras, de mortes, de destruições, de mal-estar geral.
Se, no campo das irrealidades, cada indivíduo mantivesse a sua própria conta-corrente, e, na altura do seu passamento, fosse obrigado a prestar contas, e ainda se, no balanço final, o saldo apurado resultasse, naturalmente, da diferença entre o activo e o passivo, aí, graças ao atestado de que teria de ser portador para seguir o resto do caminho, ficaria a saber se as acções praticadas, ao longo da existência, teriam sido maioritariamente positivas ou negativas.
Se esta fantasia se transformasse em realidade, era de temer que o fiscal encarregado de conferir os dados referidos no diploma, no átrio do novo depósito, fosse acumulando de tal forma saldos a vermelho, isto é, diplomas de procedimentos negativos dos seres humanos, que o chamado “fogo do Inferno” não precisava de ser alimentado por outros elementos inflamatórios.
Mas chega, por agora, o querermo-nos situar na área das fantasias. Das contabilizações despropositadas. Por mais contas que sejam feitas e por muitos saldos que se pretendam apurar, na hora da verdade, na que constitui a única certeza de que o ser humano não pode fugir, feitas as contas de cabeça ou utilizando-se qualquer das maquinetas modernas de cálculo, daquelas que a miudagem de hoje utiliza para não ter que saber a tabuada de cor, nesse momento decisivo já é indiferente apurar o saldo da vida. Os que cá ficam, esses que se cuidem. Quando muito poderão entreter-se com a avaliação dos que já morreram e que terão valor suficiente para servir de exemplo, positivo ou negativo, para serem levados em conta, quer por feitos úteis quer prejudiciais à humanidade.
Claro que há sempre quem se engane nas contas. Não faltam os que metem os pés pelas mãos e, propositadamente ou por incompetência, confundem os números, invertem as parcelas, somam onde deviam subtrair. Confundem o “trouche” e o “lebou”. Mas, não é dessa gente que está repleta a História do mundo?

sexta-feira, 13 de agosto de 2010

Especialista é todo aquele que sabe cada vez mais sobre cada vez menos.
Super especialista é o que sabe
absolutamente quase tudo sobre absolutamente quase nada.

MULHERES COM BATUTA

Mulheres e homens iguais
é hoje em dia a luta
elas já são muitas mais
ninguém lhes tira a batuta

Coitadas apanham isto
em estado deplorável
sendo Homem Jesus Cristo
só deu com o inviável

De homens estamos já fartos
que p’ra chefiar não prestam
não lhes cabe terem partos
e a convencer desembestam

As mulheres se forem belas
as suas levam avante
aos homens põem-lhes as trelas
e juntam-lhe algum picante

As mouras, essas coitadas
ainda não as deixaram
andar bem destapadas
não conseguem nem se queixam

No dia em que todos véus
burkas e roupas tapantes
só se vejam nos museus
surgem mulheres elegantes

E então a coisa muda
nasce a calma em sua terra
magrinha ou bem carnuda
com judeus acaba a guerra

Houve na História rainhas
que não cumpriram papel
mas essas, as pobrezinhas
finaram no capitel

Mas de uma forma geral
até p’ra ver o que dá
talvez seja o ideal
e tudo melhorará

Se não, então acabou-se
a experiência com os machos
não tem sido nada doce
só sabem é pôr penachos

Uma mentira política
dita por uma mulher
desperta menos a crítica
que por fulano qualquer

Eu, por mim, votarei nelas
ministra e presidenta
já crescidas ou donzelas
de idade até aos quarenta

Podem cometer uns erros
mas se os homens também fazem
a esses dão-se berros
mas os delas satisfazem








DESENCANTO POR ENQUANTO!...


Parece que, por cá, a coisa ainda não é aceite em plenitude. Por esse mundo fora e até em países europeus, é considerada em absoluto pela classe médica. Mas, em Portugal, onde se mantém a convicção de que é terra de gente muito conhecedora em todas as áreas, a acupunctura é vista pelo canto do olho.
Os milhares de anos que têm servido para os orientais recorrerem àquela ciência e com sucesso, não chegaram para nos convencer da sua validade. Ainda é praticada, entre nós, à revelia de muitos profissionais médicos que, no entanto, se se vêm muito castigados por enfermidades que a medicina convencional não resolve, às escondidas acorrem à acupunctura.
Abordo este assunto por experiência própria. Até resisti a recorrer a tal ciência, pois fui antes operado a uma hérnia discal, mas, em face do problema mal resolvido com que me debati, perante o conselho que me foi dado à boca pequena, fui cair nas mãos do japonês. Atrevi-me. Deu resultado. Agora, aconselho a acupunctura até a amigos médicos. E faço-o também por provocação.
Continuamos a lastimar o facto de não conseguirmos uma aproximação, maior e mais rápida, quanto ao espaço europeu associado. Pudera, enquanto não dispusermos da coragem de reconhecer que, imitar as experiências realizadas por outros, sendo bem sucedidos, não é uma atitude desprestigiante, antes constitui um acto de bom senso, enquanto não nos despirmos de preconceitos não passaremos da cepa torta.
O Estado português – ou, por outras palavras, os governantes - que, por exemplo, gasta fortunas com remédios tradicionais, aqueles que ainda não se receitam em doses individuais, mas sim em embalagens, cujo conteúdo excede o necessário para o tratamento -, esse Estado é excessivamente lento a mudar o que lhe está implantado nos hábitos. E nós, os que cá andamos para pagar e para obedecer, não temos mais remédio do que sermos “pacientes”.
Pacientes de duas maneiras. Porque sofremos as doenças e temos de nos encher de paciência.