domingo, 15 de agosto de 2010

DESENCANTO POR ENQUANTO!


Andavam um dia destes a pretender avaliar qual seria o homem mais rico do País. Surgiram nomes e apontaram-se valores. Fizeram-se comparações com outros milionários estrangeiros. Os jornais reproduziram caras, publicaram biografias, fizeram elogios a quase todos. Cada um deles deve ter sentido aumentar o seu ego, mas, por outro lado, também terá feito subir a preocupação quanto à segurança, ao perigo de ver acrescido o risco de uma malfeitoria praticada por outros para obter avultadas somas por resgates.
O homem corrente, como é o meu caso, não lhe passa pela cabeça que um infortúnio destes lhe possa suceder. Não se volta para trás na rua para se assegurar que não é seguido e quando sai a porta de casa não se preocupa antes para certificar-se que não haverá caras patibulares nas redondezas. Muito menos contrata seguranças que o acompanhem para toda a parte e não lhe deixem um momento sem estar a ser observado.
Em certa altura da minha existência, dei-me a miúdo com um homem muito rico deste País. Foi uma circunstância que permitiu que eu frequentasse a sua casa, porque tinha a impressão que o fulano apreciava a minha companhia. E como só lia jornais desportivos, se bem que, por razões de aumento de património, se dedicasse a coleccionar obras de arte e tivesse comprado uma preciosa biblioteca de livros raros, os quais nunca tinha tido a curiosidade de folhear um deles que fosse, como não estava ao corrente das notícias mais comezinhas utilizava-me para o informar de viva-voz sobre o que se passava por aí.
Até que um belo dia se abriu comigo e largou-me esta frase: “Sabe, eu não tenho a certeza se as pessoas com quem convivo o fazem porque me apreciam ou se não será apenas porque eu sou rico…”
Recordo-me que reagi mal. Tentei pôr os pontos nos iis no que ao meu caso dizia respeito. Mas rapidamente recuperei a compostura e, a partir desse episódio, deixei de aparecer. Ele também não me contactou, estranhando a minha ausência. Quando morreu, passados tempos, não fui ao seu enterro. Parece que, com excepção dos filhos, poucas pessoas compareceram.
Afinal, o milionário que se finou não deixou nada feito por ele. O único mérito que teve foi o de guardar obras de arte e uma biblioteca riquíssima pela sua antiguidade. Depois de morto, valia tudo muito mais do que ele terá dado para ir acumulando tais preciosidades. Os herdeiros bem satisfeitos ficaram, por certo, em face do que foi guardado por intervenção de um antiquário que o aconselhou durante toda a vida e, com isso, também ganhou muito dinheiro.
Cheguei muitas vezes a pensar na enorme diferença que se constata entre os autores das obras de arte que constituem agora uma fortuna, todos eles, pintores, escultores e escritores que, seguramente, viveram com enorme dificuldades, e os elevados valores que representam agora os produtos dos vários génios que se foram acumulando apenas para irem aumentando o seu valor.
A diferença entre esses génios e o milionário que guardou as suas obras de arte, reside apenas no facto de terem os primeiros conseguido, depois de mortos, a distinção de ficarem famosos, respeitados, apontados como exemplo, e o homem que acumulou tais trabalhos, ter conseguido honrarias em vida mas, depois de morto, cair na obscuridade e não ser referido em qualquer manual de personalidades. É a vingança dos génios.

Sem comentários: