quinta-feira, 20 de agosto de 2009

VELHOS E NOVOS




Chegar a uma idade enfastiante, com setenta e tantos anos e pedir a quem quer que seja que tenha condições para ouvir la do alto e dar resposta para não se avançar mais para diante, ultrapassar os oitenta, então, será um horror, viver nessa angústia é asfixiante, por muito que a cabeça esteja ainda no seu sítio e que, por via disso, funcione, pense, dê ainda resposta ao que dela se pede – com excepção dos esquecimentos, que esses são a demonstração permanente de que existe uma parte do cérebro que anda distraído -, ter passado todo esse tempo não perdendo de vista aquele que ainda estará à frente para percorrer, tudo isso não constitui razão para que exista alguma ânsia para que o tal momento surja, ainda que sem dar muito nas vistas e o ideal será até que ocorra uma manhã em que o acordar não se verifica.
Mas, ao mesmo tempo, sabendo-se que Moisés dirigiu o Êxodo aos oitenta aons, e que Rubinstein interpretou magistralmente Chopin, com noventa, e que, com uma elevadíssima idade, Goethe, terminou essa obra imortal que é o “Fausto”, isto entre tantos outros autores de grande nomeada que, já no fim da vida, produziram o que se mantém ao longo dos séculos, contemplando tais feitos, mesmo sem efectuar qualquer tipo de comparação, alguma consolação renasce no nosso período de velhice.
Mas, por outro lado, também darmo-nos conta de que a juventude de hoje, aquela que é agora o que fomos nós noutros tempos, com as enormes diferenças que não podem deixar de ser notadas, sem sabermos se é mais fácil hoje encontrarem a felicidade do que aquilo que se passou connosco na devida altura, constarmos que essa onda de jovens se vai debater com problemas que eram impensáveis cinquenta anos atrás, como por exemplo o que se anuncia que vai constituir uma aflição do próximo futuro, o ser considerada a água um bem escasso, entre outros factores como o aquecimento global, não pode deixar de nos fazer reflectir sobre a sorte que temos de não fazermos já parte desses tormentos quando os mesmos tocarem o mundo.
Esse é um tormento que os mais velhos acumulam com um sentimento simultâneo de inveja e de pena em relação às rapaziadas de hoje, se bem que esses, tendo as perspectivas de vir a alcançar a idade que nós temos hoje, nada nem ninguém lhes garante que tal consigam. Mas o que sim tem de constituir uma ambição e uma esperança é que, caso o Homem consiga solucionar os problemas graves que se anunciam hoje, pois o seu espírito inventivo promete que, até os bons pratos gastronómicos que são nos dias de hoje as delícias dos apreciadores e nós, os portugueses, bem sabemos o que isso significa, venham a ser substituídos por pastilhas de bacalhau com batatas e outras e bons vinhos por uns pós que venham a ser inventados.
E o excesso de população que, de dia para dia, constitui uma ameaça para toda a humanidade, essa ameaça terá de ser resolvida, por ventura, com a invasão da Lua e de Marte, pois cá já não cabem os residentes terrestres.
Perante tão arrepiante panorama, o melhor é conformarmo-nos por não passarmos muito mais tempo por cá. Pode ser que haja forma de assistir, do outro local onde se repouse, às modificações que se operarem na Esfera terrestre. É a esperança que ainda envolve aqueles que têm a sorte de ter alguma fé, seja ela qual for.
Por agora basta-nos fechar os olhos e pôr a imaginação a funcionar. E, para alguns, aqueles que se julgam com capacidade para deixar certa coisa feita, então que o façam. Pode ser que nem tudo se perca e que, daqui a certo tempo, sobretudo agora com os arquivos nos discos dos televisores, se descubra que não foram devidamente honrados os trabalhos que mereceriam algum mérito.
Que sejam os velhos a dizer isto, já que os novos não se preocupam, não têm tempo, não dão importância. E ainda bem.

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