sexta-feira, 16 de janeiro de 2009

DESENCANTO... POTR ENQUANTO!


Ter a ânsia de ser perfeito é o caminho certo para a insatisfação. Fazer qualquer coisa e concluir, no final, que foi obra sem defeito, digna de rasgado elogio, até memorável, ficar com essa convicção pessoal dará enorme prazer se não mesmo orgulho, que é a maneira feia de declararem a sua satisfação.
Esses, os tais que se orgulham por aquilo que fazem, que se sentem os melhores, de produzir o mais belo, de serem insuperáveis, que gostam muito do que praticam, tal gente vive em pleno a felicidade.
Todos os outros, de uma forma geral, perseguem a perfeição. Procuram-na incessantemente. E há os que passam ao lado e não se preocupam muito em atingi-la, embora apreciem ver os outros alcançá-la. Já não é mau.
O fazer e o refazer, o não encontrar nunca a fase definitiva ou dando a custo por acabado o já feito sem estar contente com o resultado, o desconsolar-se por não conseguir transmitir ao papel, à tela ou à pauta aquilo que vive no seu espírito, esse excesso de perfeccionismo, sendo inimigo da criação constitui, por outro lado, uma via de insistência que, poderá acabar por dar frutos aceitáveis, se não para o próprio talvez para os outros. Vale sempre a pena persistir.
É do fazer, mesmo sem rasgos de genialidade, que nascerá a possibilidade de viver alguma coisa que valha pena, ainda que não seja completamente aquilo com que se sonhou. Mas, mistério dos mistérios, por vezes surge a obra. Quando menos se espera. Aleluia! – era isto que queria dizer – exclama o que escreve, pleno de dúvidas, contemplando, com surpresa, a frase perfeita, a ideia precisa, o tema bem desenvolvido. E é assim com o pintor, como com o que compõe música. E quando a obra ideal sai à primeira, é porque estão num dia de sorte.
Os chauvinistas estão permanentemente em dias de sorte. Os insatisfeitos raramente os vivem. A questão está em saber quais são os que têm mais mérito, se uns se outros. É evidente que tudo está subordinado à qualidade da obra que produzem, mas, segundo se sabe, os mais admirados pelo que deixaram ao mundo são aqueles que, em vida, não mereceram admiração e foram até incompreendidos e mal tratados.
Ninguém perguntou a Goethe quanto tempo levou ele a escrever o Fausto, o qual só concluiu quase no fim da sua vida. Provavelmente, dada a demora, escreveu e reescreveu inúmeras vezes muitas das suas passagens.
Houve e continuará a haver alguns admiradores de si mesmos que produziram e produzem obra digna de registo. Isso, nas artes, está bem de ver. Mas tais entes felizes são a excepção. A regra é outra.
Dá para pensar se isso de fazer obras-primas, de transformar o sonho em realidade extasiando os observadores, tanto pode ser resultado de um trabalho repetido, reconstruído, renovado dos insatisfeitos, como também sairá das mãos dos repentistas, dos que produzem à primeira. E, sendo assim, pode-se concluir que o génio tanto paira nuns como nos que se apaixonam pelo que fazem.
Pode-se concluir? Mas haverá alguém que conclua alguma coisa que não seja logo objecto de contestação?
O melhor é aceitar as coisas como elas são e não querer ter a desfaçatez de pretender tirar conclusões. Eu, por mim, fico-me com as dúvidas.

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