sexta-feira, 19 de setembro de 2008

LOUCOS


Tu, que és louco
louco como te chamam,
que vives no teu mundo
isolado do resto da maralha
falando contigo mesmo
respondendo às tuas questões,
que és o interlocutor de ti próprio,
para ti não há vida.
E morte?
talvez também não
pois se não te calhou tal sorte
e, como Pessoa diz,
nem Deus,
tudo se passa ao lado,
és prisioneiro de ti próprio
mas não dás por isso,
os outros, os que te olham,
surpreendidos,
dizendo-se pesarosos,
esses não compreendem,
como têm os seus problemas
não sabem quais são os teus,
não descortinam se, no fundo,
isso em ti é felicidade,
se aquilo que é a tua imaginação,
até a tua capacidade
de seres outro,
diferente,
real ou inventado,
te transporta a uma vida etérea,
a séculos atrás,
a anos passados
ou ao futuro sonhado.
Que sabem os que te miram,
que se passa no teu íntimo?
Se é melhor que te droguem
ou que te deixem flutuar
nos teus sonhos,
nas tuas maravilhas,
nas tuas reflexões?
Que, desde que não interfira no mundo,
seria preferível
não te transportar até ele
esse que se afirma ter justiça,
a dos homens,
a dos não loucos,
a dos sapientes.
Tu, que és louco
como te chamam
deixa-te ficar
não ligues àqueles
que te atafulham
de pastilhas,
que te metem na cama
a horas certas,
no mesmo sítio,
que te dão de comer
a horas certas,
no mesmo sítio,
que te acordam
a horas certas,
no mesmo sítio.
És tu o louco, afinal?
Ou isolas-te da loucura do resto?
Dos das horas certas,
Dos do mesmo sítio.

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