
Agora, que me surgiu na ideia recordar acontecimentos que se passaram comigo e que, se não fossem relatados, acabariam por ficar guardados no baú dos tempos, também numa altura em que não encontro motivo para levar para o outro mundo cenas que, mesmo sem excessiva importância, não têm razão para não serem divulgadas, irei relatando, volta não volta, uma ou outra circunstância que, por azar das coisas, me coube a mim ter vivido.
Quem tem ideia do que foi o percurso da minha existência sabe que eu sempre andei por aí, dei-me com este e com aquele, colhi ensinamentos nos mais distantes lugares do mundo e também sofri desilusões. E sempre no exercício das minhas funções de jornalista.
Quem tem ideia do que foi o percurso da minha existência sabe que eu sempre andei por aí, dei-me com este e com aquele, colhi ensinamentos nos mais distantes lugares do mundo e também sofri desilusões. E sempre no exercício das minhas funções de jornalista.
Já me têm desafiado a escrever a minha biografia, mas, conforme parece que já também o disse antes, considero que apresentar por ordem cronológica, passo a passo, eventos que ocorreram comigo não provocará grande interesse nos que lêm.. Querem lá saber os eventuais leitores das histórias dos outros, o que fez um indivíduo num dia e como se levantou no que se seguiu. Por isso, à medida que julgue poder ser oportuno, aproveitarei estes blogues – e para alguma coisa podem servir – para contar historietas que foram vividas. E, todas com uma certeza: nenhuma é produto da imaginação.
Pois esta, que envolve uma figura que hoje é muito conhecida entre nós, a do magnate de origem chinesa de nome Stanley Ho, ocorreu comigo. E ainda estão vivas pessoas que sabem que as coisas se passaram como eu as vou contar.
Na altura em que eu exercia as funções de director do semanário “o País”, em pleno período de êxito dessa publicação, exactamente pela seriedade que punha nas acções que desempenhava, falava-se muito por cá do “chinês”, entre outras razões por ser o proprietário do Hospital Particular, que ele mandou erigir por razões que não vêm aqui ao caso, mas que talvez um dia alguém se lembre de referir. E também havia outro motivo que contribuía para a divulgação desse oriental de que poucos conheciam o nome: é que era o proprietário e explorador do jogo em Macau, actividade que o tornava num extraordinariamente rico macaense. E, ainda que com dificuldade, o seu nome começou a ser soletrado por cá: Stanley Ho.
Foi esse o motivo por que, conhecendo eu casualmente uma jovem que exercia em Lisboa as funções de uma espécie de secretária para os assuntos que o ligavam à capital do nosso País, lancei o pedido para, um dia em que o magnate nos visitasse, o pudesse entrevistar, pois que me constava que o homem não se encontrava muito satisfeito com a forma como estavam a ser tratados oficialmente os seus investimentos lá por Macau. As queixas voltavam-se contra o então governador daquela província ultramarina, como eram, nessa altura, considerados os territórios fora do Continente lusitano. Pouco passava ainda do 25 de Abril de 1974.
Tinha sido nomeado pelo M.F.A., governador daquele território, o coronel Garcia Leandro que, segundo tudo indicava, levava instruções para entregar o território macaense aos chineses. Só que, também se dizia, o Governo da China deu a resposta que quando achasse oportuno que tal sucedesse, seriam eles próprios a manifestar-se.
O ambiente em Macau, portanto, não era muito amistoso em relação aos capitalismos. E Stanley Ho pagava por tabela essa animosidade.
Pois, face ao meu interesse em entrevistar o “chinês” da altura., vi satisfeito tal interesse profissional. E, num domingo, encontrava-me eu a passar um dia de piscina no Hotel Estoril-Sol, sou surpreendido ao ser chamado ao telefone nessa tarde de pleno sol. Não podia calhar pior aquela interrupção de um aprazível momento de repouso, mas, segundo a minha interlocutora telefónica, ou seria nessa altura ou poderia não surgir outra oportunidade. Só que eu encontrava-me com a minha mulher e com um casal amigo, o então director-geral de Turismo em Portugal, dr. Cristiano de Freitas. Foi-me dito que não havia problema, pois o desejado entrevistado, que partia no dia seguinte, nos receberia a todos em sua casa, em Cascais.
Não havia, pois, outro remédio. E lá partimos todos para um trabalho que me cabia fazer. E surgiu-nos à porta de sua casa um homem alto, magro, de faces orientais, com uns simples calções e alpargatas, que ofereceu a sua casa para podermos executar a tarefa que interessava a todos. Pelos vistos, percebi depois, mais a ele até do que ao jornalista.
As senhoras foram encaminhada pra uma sala onde a sua mulher jogava Mah -Jong com umas amigas, O Cristiano – que ele teve muita honra em receber dada a sua posição elevada no Turismo Português – assistiu a toda a conversa, que se tratou mais de um caudal de queixas por parte do entrevistado do que, propriamente uma sequência de perguntas e respostas, até por que, na verdade, a ignorância da minha parte, no que se referia aos problemas que se passavam por lá, não me deixava grande margem de manobras.
O que é facto é que saí de Cascais bem fornecido de material e prova de que, na verdade, Stanley Ho estava aq ser sistematicamente impedido de efectuar investimentos na zona macaense e, segundo o queixoso, até estava aq ser ameaçado de lhe ser retirada a licença de exploração do jogo no Hotel de Lisboa.
Abro aqui um parêntesis, para confirmar que, numa entrevista que tive ocasião de fazer mais tarde ao empresário de petróleos Manuel Bullosa, este me confirmou que Garcia Leandro o teria consultado sobre a eventualidade de substituir o chinês, só que ele recusou, alegando não ser perito nesse tipo de negócios. Só conto o que me disseram, de um e de outro lado, e não posso pôr as mãos no lume por nenhuma afirmação.
Na altura dos acontecimentos e em face ás várias páginas que “o País” foi dedicando ao tema –que, jornalisticamente, era, de facto, importante -,cheguei a ser acusado de estar a receber “boas maquias” do magnate chinês. Pois bem, o único benefício que obtive foi a oferta de uma viagem a Macau, que foi extensiva ao dr. Cristiano de Freitas (que aí está, felizmente vivo, para poder testemunhar toda a verdade), visita essa, aliás, que para mim nem constituía novidade, pois tinha estado naquele território em duas ocasiões anteriores.
Stanley Ho, que sempre falou connosco em inglês, ofereceu-nos um jantar no seu barco-restaurante de nome Jumbo, em Hong Kong e, no dia seguinte, um almoço na sua casa no alto da mesma cidade. E forneceu mais material de prova de que o governador, ao saber que ele me tinha convidado para efectuar aquela visita – disse-me o próprio investidor chinês – ainda o castigava mais do que antes.
Mas, de todo este folhetim, o que posso eu considerar que resultou num benefício para Portugal – dado não ser outro o meu interesse em toda a matéria? Aqui deixo o meu veredicto:
Durante o almoço e na presença do dr. Crstiano de Freitas, Stanley Ho declarou com todo o ar solene, que a não terminar imediatamente aquilo que ele considerava ser uma perseguição de tipo pessoal, ele retiraria todos os investimentos que tinha feito em Portugal e não aplicaria nem mais um centavo em terras portuguesas. Já tinha destino para canalizar os milhões de dólares de que desejava desviar para o nosso País.
Foi uma sobremesa que nos caiu bastante mal e não consegui desfazer a ideia que parecia ter sido tomada com total convicção de que não havia outro passo a dar.
E assim regressei a Lisboa e, nas páginas de “o País”, ainda lancei mais algumas achas para a fogaça, dando seguimento a provas que ia recebendo de Macau.
Até que, não passando muito tempo, recebo um dia um telefonema do Presidente da República, General Ramalho Eanes. E a pergunta que me fez foi apenas esta: “Tem provas de tudo o que tem saído no seu Jornal sobre o caso de Macau?” Respondi com a mesma clareza: “Não publico nada que não seja sujeito previamente à demonstração da verdade. Poso garantir que tenho elementos em meu poder que suportam as afirmações que têm sido feitas!”
O Presidente só quis saber se eu estaria disposto a receber no meu Jornal o general Melo Egídio e a mostrar-lhe todos os elementos que possuía. E, em termos de “off record”, comunicou-me que seria este militar que iria substituir o coronel Garcia Leandro.
Fomos almoçar a um restaurante do Bairro Alto e eu entreguei ao general todo o manancial de provas que me tinha sido facultado por Stanley Ho. Passado pouco tempo deu-se a substituição dos responsáveis na governação de Macau. E a minha participação acabou aqui.
E só a título de esclarecimento: nunca recebi de Stanley Ho o mais pequeno agradecimento, por todo o meu empenho em não se perder para outro País aquilo que me foi ameaçado que sucederia se as coisas se mantivessem em Macau como ocorria naquela época de tanta queixa do “chinês”.
O Casino Estoril progrediu ao ponto que se conhece agora. O Casino de Lisboa constituiu outro investimento de vulto tal qual se encontra na situação actual, até com o apoio que os Governos de Lisboa têm dado quanto à propriedade do terreno na Expo. Ainda bem.
Mais uma vez se provou que a tese do “homem e as circunstâncias” muitas vezes produzem grandes feitos.
Eu assisto de longe. E agrada-me saber que um homem que poderia ter sido condenado a viver no Brasil, quando para lá partiu depois do 25 de Abril, hoje beneficia das vantagens resultantes de o investidor macaense que esteve a dois passos de ir pôr os seus dinheiros noutras paragens longínquas, ter acabado por optar por Portugal.
Vale a penas, por vezes, ter destas satisfações!...
Pois esta, que envolve uma figura que hoje é muito conhecida entre nós, a do magnate de origem chinesa de nome Stanley Ho, ocorreu comigo. E ainda estão vivas pessoas que sabem que as coisas se passaram como eu as vou contar.
Na altura em que eu exercia as funções de director do semanário “o País”, em pleno período de êxito dessa publicação, exactamente pela seriedade que punha nas acções que desempenhava, falava-se muito por cá do “chinês”, entre outras razões por ser o proprietário do Hospital Particular, que ele mandou erigir por razões que não vêm aqui ao caso, mas que talvez um dia alguém se lembre de referir. E também havia outro motivo que contribuía para a divulgação desse oriental de que poucos conheciam o nome: é que era o proprietário e explorador do jogo em Macau, actividade que o tornava num extraordinariamente rico macaense. E, ainda que com dificuldade, o seu nome começou a ser soletrado por cá: Stanley Ho.
Foi esse o motivo por que, conhecendo eu casualmente uma jovem que exercia em Lisboa as funções de uma espécie de secretária para os assuntos que o ligavam à capital do nosso País, lancei o pedido para, um dia em que o magnate nos visitasse, o pudesse entrevistar, pois que me constava que o homem não se encontrava muito satisfeito com a forma como estavam a ser tratados oficialmente os seus investimentos lá por Macau. As queixas voltavam-se contra o então governador daquela província ultramarina, como eram, nessa altura, considerados os territórios fora do Continente lusitano. Pouco passava ainda do 25 de Abril de 1974.
Tinha sido nomeado pelo M.F.A., governador daquele território, o coronel Garcia Leandro que, segundo tudo indicava, levava instruções para entregar o território macaense aos chineses. Só que, também se dizia, o Governo da China deu a resposta que quando achasse oportuno que tal sucedesse, seriam eles próprios a manifestar-se.
O ambiente em Macau, portanto, não era muito amistoso em relação aos capitalismos. E Stanley Ho pagava por tabela essa animosidade.
Pois, face ao meu interesse em entrevistar o “chinês” da altura., vi satisfeito tal interesse profissional. E, num domingo, encontrava-me eu a passar um dia de piscina no Hotel Estoril-Sol, sou surpreendido ao ser chamado ao telefone nessa tarde de pleno sol. Não podia calhar pior aquela interrupção de um aprazível momento de repouso, mas, segundo a minha interlocutora telefónica, ou seria nessa altura ou poderia não surgir outra oportunidade. Só que eu encontrava-me com a minha mulher e com um casal amigo, o então director-geral de Turismo em Portugal, dr. Cristiano de Freitas. Foi-me dito que não havia problema, pois o desejado entrevistado, que partia no dia seguinte, nos receberia a todos em sua casa, em Cascais.
Não havia, pois, outro remédio. E lá partimos todos para um trabalho que me cabia fazer. E surgiu-nos à porta de sua casa um homem alto, magro, de faces orientais, com uns simples calções e alpargatas, que ofereceu a sua casa para podermos executar a tarefa que interessava a todos. Pelos vistos, percebi depois, mais a ele até do que ao jornalista.
As senhoras foram encaminhada pra uma sala onde a sua mulher jogava Mah -Jong com umas amigas, O Cristiano – que ele teve muita honra em receber dada a sua posição elevada no Turismo Português – assistiu a toda a conversa, que se tratou mais de um caudal de queixas por parte do entrevistado do que, propriamente uma sequência de perguntas e respostas, até por que, na verdade, a ignorância da minha parte, no que se referia aos problemas que se passavam por lá, não me deixava grande margem de manobras.
O que é facto é que saí de Cascais bem fornecido de material e prova de que, na verdade, Stanley Ho estava aq ser sistematicamente impedido de efectuar investimentos na zona macaense e, segundo o queixoso, até estava aq ser ameaçado de lhe ser retirada a licença de exploração do jogo no Hotel de Lisboa.
Abro aqui um parêntesis, para confirmar que, numa entrevista que tive ocasião de fazer mais tarde ao empresário de petróleos Manuel Bullosa, este me confirmou que Garcia Leandro o teria consultado sobre a eventualidade de substituir o chinês, só que ele recusou, alegando não ser perito nesse tipo de negócios. Só conto o que me disseram, de um e de outro lado, e não posso pôr as mãos no lume por nenhuma afirmação.
Na altura dos acontecimentos e em face ás várias páginas que “o País” foi dedicando ao tema –que, jornalisticamente, era, de facto, importante -,cheguei a ser acusado de estar a receber “boas maquias” do magnate chinês. Pois bem, o único benefício que obtive foi a oferta de uma viagem a Macau, que foi extensiva ao dr. Cristiano de Freitas (que aí está, felizmente vivo, para poder testemunhar toda a verdade), visita essa, aliás, que para mim nem constituía novidade, pois tinha estado naquele território em duas ocasiões anteriores.
Stanley Ho, que sempre falou connosco em inglês, ofereceu-nos um jantar no seu barco-restaurante de nome Jumbo, em Hong Kong e, no dia seguinte, um almoço na sua casa no alto da mesma cidade. E forneceu mais material de prova de que o governador, ao saber que ele me tinha convidado para efectuar aquela visita – disse-me o próprio investidor chinês – ainda o castigava mais do que antes.
Mas, de todo este folhetim, o que posso eu considerar que resultou num benefício para Portugal – dado não ser outro o meu interesse em toda a matéria? Aqui deixo o meu veredicto:
Durante o almoço e na presença do dr. Crstiano de Freitas, Stanley Ho declarou com todo o ar solene, que a não terminar imediatamente aquilo que ele considerava ser uma perseguição de tipo pessoal, ele retiraria todos os investimentos que tinha feito em Portugal e não aplicaria nem mais um centavo em terras portuguesas. Já tinha destino para canalizar os milhões de dólares de que desejava desviar para o nosso País.
Foi uma sobremesa que nos caiu bastante mal e não consegui desfazer a ideia que parecia ter sido tomada com total convicção de que não havia outro passo a dar.
E assim regressei a Lisboa e, nas páginas de “o País”, ainda lancei mais algumas achas para a fogaça, dando seguimento a provas que ia recebendo de Macau.
Até que, não passando muito tempo, recebo um dia um telefonema do Presidente da República, General Ramalho Eanes. E a pergunta que me fez foi apenas esta: “Tem provas de tudo o que tem saído no seu Jornal sobre o caso de Macau?” Respondi com a mesma clareza: “Não publico nada que não seja sujeito previamente à demonstração da verdade. Poso garantir que tenho elementos em meu poder que suportam as afirmações que têm sido feitas!”
O Presidente só quis saber se eu estaria disposto a receber no meu Jornal o general Melo Egídio e a mostrar-lhe todos os elementos que possuía. E, em termos de “off record”, comunicou-me que seria este militar que iria substituir o coronel Garcia Leandro.
Fomos almoçar a um restaurante do Bairro Alto e eu entreguei ao general todo o manancial de provas que me tinha sido facultado por Stanley Ho. Passado pouco tempo deu-se a substituição dos responsáveis na governação de Macau. E a minha participação acabou aqui.
E só a título de esclarecimento: nunca recebi de Stanley Ho o mais pequeno agradecimento, por todo o meu empenho em não se perder para outro País aquilo que me foi ameaçado que sucederia se as coisas se mantivessem em Macau como ocorria naquela época de tanta queixa do “chinês”.
O Casino Estoril progrediu ao ponto que se conhece agora. O Casino de Lisboa constituiu outro investimento de vulto tal qual se encontra na situação actual, até com o apoio que os Governos de Lisboa têm dado quanto à propriedade do terreno na Expo. Ainda bem.
Mais uma vez se provou que a tese do “homem e as circunstâncias” muitas vezes produzem grandes feitos.
Eu assisto de longe. E agrada-me saber que um homem que poderia ter sido condenado a viver no Brasil, quando para lá partiu depois do 25 de Abril, hoje beneficia das vantagens resultantes de o investidor macaense que esteve a dois passos de ir pôr os seus dinheiros noutras paragens longínquas, ter acabado por optar por Portugal.
Vale a penas, por vezes, ter destas satisfações!...

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