quinta-feira, 8 de maio de 2008

DESENCANTO...POR ENQUANTO!


É costume dizer-se: “passou-me uma coisa pela cabeça!...”, e isso justifica uma acção mal conduzida, uma palavra dita de forma não apropriada, um rompante pouco digerido. Na verdade, isto de passar pela cabeça representa, quase sempre, algo que aflorou de repente, que não deu tempo a ser devidamente soletrado no complicado órgão que se encontra no interior da caixa craniana. Não se tratou de um pente ou de uma escova que correu ao longo dos cabelos, nem mesmo uma toalha que enxugou uma cabeça lavada. Nada que tenha ocorrido por fora. Foi uma ideia, um relâmpago que tanto pode ser luminoso como escurecido por qualquer sombra negra. Mas tudo por dentro.
Quando, depois do lapso de tempo que demorou o tal raspão no pensamento e, assentadas as ideias, se reflecte sobre o conteúdo do que surgiu de maneira tão fugaz, pode-se concluir uma de duas coisas: que se tratou de uma fantasia, de algo que não deve ter seguimento, que teve até consequências nefastas, e por não ter sido ponderada antes de ser mostrada para o exterior, tem de ser rectificado logo que possível; ou, pelo contrário, tendo sido alguma coisa que era portadora de uma luz brilhante, de uma proposta merecedora de ser aprofundada, de algo que só surge quando se anda à busca de imaginação renovada, então valerá a pena explorar com mais profundidade o que saiu de rompante.
A cabeça, no sentido psíquico propriamente dito, tem enorme serventia, quando é bem usada. Ter boa cabeça, como é corrente ouvir-se de alguém que se comporta dentro dos princípios morais e cívicos mais aceitáveis, é, por isso, sinónimo de bom cidadão. Tem má cabeça quem não se contem nos gastos, não consegue assentar nas actividades que desempenha, ou quando se verifica uma mudança frequente de parceiro matrimonial sem motivo compreensível. E há outras manifestações da tal má cabeça.
Não obstante, sendo a dita cabeça boa ou má, pode suceder às duas situações passar pela cabeça uma ideia que se possa considerar como valiosa e que, bem desenvolvida, pode revelar uma obra também ela com valor. A um artista acreditado, não importando se é portador de bom ou mau carácter, pode ocorrer passar-lhe pela cabeça algo que, só os dotados de talento tem a faculdade de poder agarrar. E é nessas circunstâncias que surgem, a miúdo, obras-primas. ´
Mas, provavelmente, os que andam com a cabeça no ar, aqueles que nada lhes passa pelo bestunto, são os que têm menos preocupações. Como só lhes entra ar, esse elemento que é essencial à vida mas apenas serve para alimentar os pulmões, não há raio de brilho que se intrometa no percurso oco que constitui o seu cérebro. Esses, de facto, não pensam.
Imaginem o que me passou por dentro da caixa craniana, para ter escrito este texto que, provavelmente, não tem pés… nem cabeça!..



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