quarta-feira, 19 de maio de 2010

UM NÃO E UM SIM


CADA um por seu lado, é desta forma que cá vamos andando nesta Terra dos desentendimentos. É assim. E a nós só nos resta observar e ter paciência.
Enquanto o Homem que tanto contribuiu para que Portugal, sofrendo os efeitos de uma crise mundial, não tivesse sido resguardado, dentro do algo que ainda fosse possível, do mal que nos atingiu, disparou 87 “nãos” às perguntas por escrito que a Comissão de Inquérito, que tem andado aí a tentar inquirir nem se sabe bem o quê, lhe enviou para o Governo, enquanto isso e quase simultaneamente o Presidente da República, numa explicação que entendeu dar ao País - e ainda bem que o fez, tendo-se entendido perfeitamente a sua preocupação relacionada com a próxima reeleição a Belém -, dizia “sim” ao diploma que lhe tinha sido enviado pelo Parlamento e que o Tribunal Constitucional não reprovou, aquele que estabelece o casamento entre seres humanos do mesmo sexo.
Eis, pois, como um “não” de um lado e um “sim” do outro, cada qual referido a assuntos diferentes, mas ambos provenientes de figuras de topo da condução do País, têm a possibilidade de constituir faltas à verdade, o que, nos seres humanos comuns, é tão natural, pois que as realidades são, com frequência, difíceis de admitir. Não quero chegar ao extremo de afirmar que as duas afirmações se possam apelidar exactamente de mentiras, no entanto, com um sentido de abertura que faz tanta falta no nosso País, deixo apenas um rasto de dúvida. Cada qual que interprete como quiser.
Eu entendo assim: José Sócrates, que sempre disse, até àquela data que tanto foi divulgada, que não tinha conhecimento da negociação que estava em curso e de que, essa é a verdade, muita gente estava ao corrente, não podia esperar que, ao ser interrogado na Assembleia da República, fosse acreditado por mostrar a sua ignorância. Tinha de ser, realmente, no mínimo pouco crível que o chefe do Executivo, com todo o batalhão de assessores, não tivesse sido informado que a PT, a empresa onde o Estado detém uma posição maioritária, estava na altura a negociar a compra da televisão, dominada pelos espanhóis, a TVI, por sinal a mesma a que ele tinha já dado largas mostras de ser um adversário a ferro e fogo, iniciada essa má disposição através dos programas informativos de Sextas-feiras, com Manuela Moura Guedes a exercer o papel de crítica feroz da sua actuação governativa.
Isso, no que diz respeito a Sócrates. Já no caso do “sim” do Presidente da República, aí o motivo é claramente outro. Não é necessário conhecer-se pessoalmente Cavaco Silva para deduzir que, tanto por si como na qualidade de detentor daquele lugar cimeiro do Estado, será antagónico quanto a concordar com o chamado casamento dos “gays”. Se não tivesse sido nesta altura, relativamente próxima do acto eleitoral que vai realizar-se para Belém, provavelmente que o Chefe Supremo da Nação não teria hesitado em devolver ao Parlamento o diploma que ganhou a maioria dos seus deputados para ter chegado às suas mãos. Estava no seu direito e, ainda que voltasse de novo para ser votado e passasse dessa segunda vez, Cavaco Silva libertar-se-ia de ter contribuído para que os homens e as mulheres portugueses unissem legalmente, dentro do mesmo sexo, os seus destinos.
Aos portugueses, que ainda se encontram embaraçados pelas medidas anunciadas e que vão entrar em vigor no próximo dia 1 de Julho, estes “não” e “sim” declarados pelas duas figuras só lhes provocará um rápido encolher de ombros. “Quero lá saber”, será a frase que as tias Marias e os senhores Naneis do nosso País, de Norte a Sul e, em particular, na aldeias e vilas, deixarão sair, isto se se derem conta das posições tomadas pelos “chefões”. Porque são outras as preocupações que envolvem os milhões de compatriotas, dos reformados, dos que ganham pouco e, sobretudo dos desempregados.
Mas, como não se enquadram em nenhuma destas situações os que entenderam ser negativos e afirmativos na situação que é aqui tratada, logo as suas preocupações são de tipo mais pessoal do que condizentes com o Portugal que é o nosso e do que necessita é de que sejam enfrentados os graves problemas que aí estão e os que estão em vias de lhe bater à porta.

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