sábado, 5 de setembro de 2009

ÉTICA JORNALÍSTICA



O que se tem falado e discutido, ao longo destes dias, sobre a questão do afastamento de Manuela Moura Guedes do seu programa de Informação, surgindo perante as câmaras de televisão tudo que pretende ser sabedor sobre uma matéria que, digam o que disserem, se trata de algo especializado que os jornalistas, especialmente os mais antigos, é que podem ainda ter alguma experiência e debitar considerações com pés e cabeça, tudo isso, no que a mim diz respeito, não deve passar sem o mínimo de acréscimo que pode ajudar a fazer luz no que se refere a este tema.
Em primeiro lugar, atendendo à Lei mas, sobretudo, à ética profissional, o director de um órgão de Informação, enquanto a Administração mantiver nesse lugar quem lá se encontra, é quem tem autoridade absoluta para orientar o que se escreve e o que é transmitido ao público espectador, ouvinte ou leitor. O corpo redactorial, por sua vez, só tem de atender às directrizes e aos acordos que sejam recebidos e feitos com a Direcção e seus adjuntos. O direito que cabe a um jornalista, na circunstância de não se mostrar disposto a acatar as orientações que lhe sejam comunicadas na respectiva escala hierárquica, é apenas o de se demitir ou então sujeitar-se às pressões que sejam feitas.
Da mesma forma, um profissional do jornalismo que apresente aos seus superiores na Redacção uma notícia que levante dúvidas ou que implique um mau acolhimento por parte dos superiores hierárquicos do órgão, sendo-lhe pedido para identificar a fonte que deu origem a tal texto, a Lei também dá cobertura ao secretismo e permite que o portador da novidade oculte a origem do que é apresentado. A escala jornalística superior pode impedir que saia à luz o referido texto, o que não pode é aplicar qualquer tipo de penalização ao profissional que foi o seu portador.
Tudo isto é claro e não justifica movimentações de opiniões contrárias. Só que, evidentemente, quando se levantam estes problemas no interior dos órgãos de Informação, o ambiente já tem de ser excessivamente pesado, o que não é, de forma alguma, aconselhável que aconteça num local onde a criatividade tem de estar sempre fresca e pouco abalada por questiúnculas internas.
Há que dizer, no entanto, que, na actualidade, a interferência do chamado interesse financeiro, dos valores representados pelos proprietários dos jornais, escritos e falados, como também tem importância a área política em que os órgãos se situam, tudo isso pesa na orientação jornalística de tais veículos de Informação. É triste, mas é verdade. E, sobretudo, se a orientação jornalística do órgão colide com interesses publicitários de empresas cujo uso da sua imagem é de elevado valor, também aí, por vezes essa força pesa bastante e força a alterações de caminhos a percorrer.
Tendo o caso da TVI essencialmente na base deste conflito e, acima de tudo, o estilo da subdirectora de Informação e apresentadora do Jornal de sexta-feira, há que dizê-lo com total franqueza que a forma que Manuela Moura Guedes utilizava para efectuar entrevistas e para transmitir notícias, não assentavam no espírito isento e independente que deve caracterizar um jornalista que tem obrigação de não emitir opiniões no decorrer desse trabalho concreto.
Eu aprendi, há mais de cinquenta anos, que um entrevistador não deve nem pode misturar uma pergunta com uma opinião pessoal. Deve saber ouvir e, quando muito, apresentar outra questão que tenha como objectivo esclarecer a resposta que foi dada antes pelo seu interlocutor. E essa função é quanto mais difícil quanto maior for o desencontro de opiniões – no íntimo – que separe o entrevistador do entrevistado. Só que, do lado do que tem o encargo de dar respostas, não deve nunca surgir a suspeita de que o jornalista se apresenta como adversário das suas ideias e em contradição com os seus pontos de vista.
Isso, Manuel Moura Guedes, que, reconheçamos, nunca foi capaz de exercer o papel de jornalista, parece ter gozado sempre da protecção do marido, o recentemente saído director-geral da TVI. E esse lugar também lhe terá provocado um sentimento de mando que não se coadunava com o simples papel de directora-adjunta de Informação. Tudo isso lhe fez mal.
E depois, a circunstancia também de ter exercido, durante algum tempo, as funções de deputada pelo CDS no Parlamento – o que é uma actividade incompatível com a que exercia na TVI -, tudo isso só contribuiu para não lhe dar bagagem suficientemente sólida para se fixar com firmeza no papel de jornalista.
No fundo, todos procederam mal. A visada e a administração da TVI, esta sobretudo porque não foi capaz de entender que o “time” em que actuou com aquela firmeza foi o mais despropositado possível. Devia ter esperado pela realização das eleições no dia 27, por muito que isso lhe custasse.
Mas, aquilo que eu sei de José Luís Cébrian, o homem forte da Prisa espanhola, dona e senhora do comando da TVI e do grupo que tem a posição maioritária, não me causa admiração no que diz respeito ao mau passo dado. E foi pena que, aqueles que, do lado de cá, olham sempre com azedume as tomadas de posições de Madrid com relação a Lisboa, aproveitem esta ocasião para se regozijarem com a má intervenção dos vizinhos.
Vamos a ver como é que isto fica tudo. Mas, que José Sócrates, não beneficiará nada, na hora das eleições, com este passo de que até poderá não ter tido influência, lá quanto a isso tenho poucas dúvidas.
Depois falamos.