Isto de ser escritor
porque muito escreve
com fervor
e se atreve
e o querer ser poeta
sem desistir
e de uma forma secreta
persistir
este afã, tal teimosia
como agora é o que faço
na esperança de que algum dia
me compensem o cansaço
e tenha valido a pena
por exemplo
ter afastado a pintura
que era um outro templo
a pertencer à tortura
só espero que o meu fim
seja no momento exacto
sem toques de clarim
e não firmando contrato
não ficando texto a meio
nem verso por acabar
p’ra não haver remedeio
e ser outro a emendar
o que estava feito antes
com susto e suor
e surjam alguns pedantes
a roubarem o autor
Mas isto de ser escritor
e de pouco génio poeta
se não o fez com primor
e usou mal a caneta
em vida
despercebido
não teve boa guarida
e mal foi ouvido
resta ainda a boa esperança
de passados muitos anos
tenha a bem-aventurança
de reconhecidos enganos
porque isso já se passou
com figuras conhecidas
e foi algo que marcou
algumas vidas sofridas
entre elas bem destaco
alguém que por Lisboa
consumiu muito tabaco
esse Fernando Pessoa
que deixou a papelada
espalhada por gavetas
que só depois foi juntada
e inspirou mais poetas
como sucedeu comigo
que o tenho sempre presente
e bem alto eu o digo
e nisso eu sou um crente
por um Pessoa ter havido
reconhecido só depois
se agora sou desvalido
mais tarde seremos dois
Se há quem tanto se gabe
sem razão para o fazer
não sei se a mim me cabe
gozar de tal prazer
presunção
e água benta
isso está na nossa mão
basta que nos dê na venta
Pois isto de ser escritor
e de também versejar
o preciso é ter amor
e em si acreditar
boa escrita
bons poemas
é tudo uma desdita
dificuldades extremas
à espera que um editor
jogue na carta certa
e acredite que o autor
é uma sua descoberta
que valha a pena
apostar
que nesta vida terrena
para mais tarde ganhar
o respeito dos leitores
que são sempre os julgadores.
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