Quem anda atento ao que se passa no mundo em que vivemos e, em particular, ao que ocorre neste nosso País, por mais optimista que seja e defensa a tese do copo meio-cheio, não pode encolher os ombros e deixar andar, porque "alguém acabará por resolver isto tudo".
Eu pertenço ao sector do copo meio-vazio, muito embora oculte uma limitada esperança de que os homens terão de chegar, na curva do caminho, a uma conclusão positiva de que não poderemos continuar muito mais tempo assim e, em Portugal, especificamente, essa malta política, governos e oposições, acabará por meter a mão na consciência quanto ao muito mau que terá sido feito já nos largos anos de democracia, não usando a liberdade para proveitos próprios e dos seus amigos. Até hoje, nunca sairam dos lugares públicos com uma mão à frente e outra atrás, pois o Homem até faz anúncios públicoa a gritar "Eu é que não sou parvo!..."
Pois hoje pus-me a ler nos jornais as notícias com letras gordas e fiquei deveras preocupado. Não que se trate de uma novidade para quem, no jornalismo, viu de tudo, mas, mesmo assim, e perante as circunstâncias em que vive a maioria dos portugueses, não pude esconder uma amargura que se crava no âmago de quem sempre lutou, sobretudo antes da Revolução, pela moralidade da vida nacional. Mas sou mais explícito quanto às notícias vindas hoje a lume: por exemplo, o caso referido do Valentim Loureiro (desde a guerra colonial conhecido pelos seus colegas como o "capitão das batatas" -perguntem-lhe a ele porquê, que ele fusiosamente não responde -), que, segundo declaração entregue ao Tribunal Constitucional, recebe por trabalho dependente 120 mil euros e de pensões 8.600 euiros, tudo isso para além de possuir terrenos e casas de Norte a Sul do País e fazer parte de 16 empresas com participações financeiras avultadas em cada uma, sendo, para além disso, proprietário de 4 viaturas de luxo.
Também a notícia de que o ministro da Cultura, Pinto Ribeiro, tem mais de 2 milhões e meio de euros nos bancos e é dono de seis empresas, para além de ter funções em outras 30, pelo declarou ter auferido 93 milhões de euros de rendimento de trabalho em 2006, esta situação tornada pública dá bem a ideia do myuito que dá para nos recoltarmos perante as misérias que pululam por aí, a maioria delas pobrezas envergonhadas.
Mas não ficam por aqui as notícias saídas hoje à estampa. A novidade de que Pinto da Costa, o tal que tem um nome comprido que os locutores das rádios e das televisões pronunciam respeitosamente com o acrescento de Jorge Nuno, esse não esconde que ganha 10 mil euros por mês no Futebol Clube do Porto, muitio embora se tenha verificado na declaração do IRSA que o seu salário é cinco vezes maior!
Neste dia de sol radiante - não nos queixemos depois que há falta de água nos campos -valerá a pena nós, os da cidade, deixarmo-nos arrastarNão demorei quase nada a encontrar uma saída. Como eu costumava recorrer à biblioteca da Embaixada Americana para efectuar consultas, alí descobri um livro intitulado “Dictionary of Dates”, que me deu uma ideia: a de escrever uma obra que, em vários volumes, mostrasse a história do mundo por datas – a que atrás me refiro de passagem. Mas, para ser levada com a minúcia que entendia, não poderia levar a cabo tamanha tarefa sozinho.
Verdade seja que essa atitude só foi tomada depois de eu ter feito um contrato com um editor, o Gomes & Rodrigues, que tinha livraria no largo de D. Estefânia e tipografia própria bastante moderna para a época.
Firmámos, pois, o acordo editorial o qual obrigava a entregar mensalmente texto equivalente a dois fascículos da obra que se passou a chamar Dicionário Enciclopédico de Datas. Em contrapartida, como adiantamento de 20% sobre o preço de capa, a editora pagava mensalmente 6.000 escudos, o que, na altura, se poderia considerar aceitável.
Era necessário, para se poder dar cumprimento ao assumido contratualmente, isto é do texto, fotografias e paginação do equivalente a dois fascículos por mês, o que constituía um esforço enorme, arranjar um local fixo de trabalho.
Foi aí que se começou a escrever o Dicionário Enciclopédico de Datas, tendo constatado que a obra requeria a consulta exaustiva de inúmeros livros de diversas nacionalidades, que se iam obtendo nas embaixadas existentes em Portugal e, nos casos em que não havia relações, como foram as situações da Albânia, Checoslováquia e outras, recorreu-se às delegações diplomáticas em Paris ou Londres. E de tudo se faziam fichas datadas dos acontecimentos históricos por ordem cronológica.
Quando se completaram os primeiros 24 fascículos, o que correspondia ao primeiro volume encadernado, de harmonia com o contrato e visto que estava toda a edição vendida por assinaturas e existia um acordo com uma empresa brasileira que adquiria em conta firme mil volumes encadernados, o editor efectuou o primeiro pagamento dos direitos de autor, deduzidos os adiantamentos, o que me deu ocasião para comprar o primeiro automóvel, um Rover em segunda mão.
Impunha-se aproveitar ao máximo possível o escritório de que se dispunha. Havia necessidade de criar outra fonte adicional de rendimento, evidentemente dentro da área literária e jornalística. Mas havia que contornar a dificuldade chamada Censura, pois era mais do que evidente que eu não gozava da aceitação política da situação, como já foi referido. Mas, mesmo sabendo da má ficha que tinha na PIDE, tentei a minha sorte: propus a edição de uma revista mensal, com o título “PN”, que, para efeitos externos, quereria dizer publicidade e negócios, mas que, na verdade, pretendia dedicar-se ao tema política e negócios.
Até parece que os capitães da Censura adivinharam as intenções e decidiram “chumbar” o meu nome como director da publicação.
Foi nesse entretanto que, acumulando sempre com as minhas outras obrigações – e, uma vez mais, roubando ao descanso o que precisava de tempo -, pedi asilo ao Norberto Lopes, que tinha ensaiado ser o director da revista “Mundo Ilustrado”, atrás referida, para ingressar na redacção do “Diário de Lisboa”. Fui admitido e tive como chefe o jornalista Mário Neves, que veio a ser, depois do 25 de Abril, embaixador de Portugal na União Soviética. por tanta injustiça ? Vale, sim. Digo eu. Não podemos ficar indiferentes, por muito pouco que valha a pena irritarmo-nos.
Mas, o tal "direito à indignação", como disse o outro, que também não tem razões de queixa do que a vida lhe ofereceu depois do 25 de Abril, isso ninguém nos pode retirar.
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