domingo, 5 de dezembro de 2010

SÁ CARNEIRO


VALE A PENA INCOMODARMO-NOS com tudo que corre mal no nosso País? Cada vez que me debruço sobre as notícias que saem a lume e verifico que as suas características e a ausência de soluções no que se refere aos inúmeros problemas que se arrastam tempos infinitos sem solução, podendo-se por isso considerar como características portuguesas, passada que se encontra há já muito tempo a indignação que, a pouco e pouco, foi diminuindo, o que faço para me defender dessa sensação é uma de duas coisas: não comprar tantos jornais como fazia anteriormente e, se os adquiro, ler só os títulos e passar por cima dos pormenores. Claro que isto escrevo eu agora, porque a verdade é que não consigo libertar-me de uma específica revolta pela indiferença das forças públicas em dar mostras de fazer o seu trabalho e de ir protelando o encontro das respostas que se impõem para esclarecimento da opinião pública.
Querem então um exemplo das nossas características? Pois aí vai: o caso chamado de Camarate, ou seja o acontecimento que fez agora 30 anos que ocorreu e que consistiu na queda do pequeno avião que transportava Sá Carneiro e os seus acompanhantes, Amaro da Costa e familiares e de elementos que faziam parte do grupo que ia apoiar a candidatura de Soares Carneiro ao Porto, que provocou a morte de todos os ocupantes, esse caso ainda hoje se encontra entregue a um pleno mistério.
É verdade, passara três décadas e não se apurou ainda se se tratou de um acidente ou se foi um crime preparado, até, segundo dizem, em que o principal visado seria o então ministro da Defesa, Amaro da Costa. Mas nunca nada ficou esclarecido.
Ficou bem claro que as instituições que possuímos para encontrar respostas a problemas que nos são postos, como este de um avião que, mal levanta voo do aeroporto de Lisboa, logo a seguir se despenha em Camarate, essas forças especializadas não dispõem de elementos que não se fiquem rigorosamente mudas e não haja uma só pessoa que seja capaz de assumir o defeito, o erro, a incompetência, seja o que for, pelo menos para que se aponte o dedo a quem apresenta tal falta de capacidade.
Não tenho mais nada a acrescentar a tamanha demonstração de inexistência de sentido de responsabilidade. E nunca ninguém é chamado a assumir as culpas, sendo o silêncio e o passar do tempo que serve para que se acabe por esquecer o que para trás ficou. Mas, também muito no nosso estilo, nesta altura, tantos anos ocorridos, a data comemorativa do acontecimento serve para fazer contas e prognósticos quanto ao que se passaria hoje se Sá Carneiro não tivesse morrido então. E as conjecturas mais dispares saíram de inúmeras cabeça pensantes, alvitrando a situação que teria hoje Portugal na eventualidade da acção do líder na época do PPD se ter prolongado até aos dia de hoje.
Eu, por mim, sinto-me incapaz de imaginar um panorama actual em tais circunstâncias. E isso porque, desde então e até à data, muitas coisas ocorreram que influíram sobremaneira na conduta dos políticos portugueses e ninguém pode garantir que, por um lado, o povo português se tivesse mantido fiel a uma votação ao centro e, por outro, Sá Carneiro conseguisse utilizar a sua compostura política dentro de normas que, com os tempos e também com a nossa adesão à CEE, se alteraram profundamente.
Claro que, no que diz respeito a uma comparação com a actuação de José Sócrates, caso esse paralelo tivesse lugar, não se imagina a mão do tão desejado politico desaparecido a fazer alguma coisa semelhante ao que o socratismo saltou cá para fora.
Seja como for, admita-se a situação que se quiser, o que me faz a mim pensar nesta altura – pois que não vale a pena transportarmo-nos a situações que já estão fora das hipóteses – é como é possível que haja ainda quem deseje ser presidente desta Republica e chefe de um Governo deste País, para dirigir não sei o quê e comandar não se sabe que forças. Só se for para se colocar à cabeça de um grupo que, sem rei nem roque, com um pretendente a um trono que também acabou por se desfazer e o seu detentor em ir para o Brasil, na tentativa de ali existirem melhores perspectivas, o que também não aconteceu, só se for, repito, com a ideia de que, neste Rectângulo republicano, ainda hoje se vai mantendo a esperança de que acabemos por vir a ser alguma coisa que, para além da língua, que essa é valiosa, mereça considerar-se Pátria.
Estão enganados! Não se trata de falta de patriotismo, mas sim o desejo de acabar por partir para outros aléns e de, na hora da despedida, olhar para trás não com o azedume do espectáculo que fica mas com a satisfação de apreciar as inúmeras portas que ficam abertas para um futuro risonho que se deixa aos que vêm a caminho. O que não quero é ter de esconder a cara!...


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