segunda-feira, 5 de julho de 2010

ANGÚSTIA


POIS É ISSO. E volto ao tema de ontem. Esta angústia que me anda a roer por dentro, que me acompanha ao longo dos dias, que me tira todas as forças para me ir mantendo neste mundo que, no meu entender, já nem merece que nos inquietemos por ela, a minha e a dos outros que também a têm, pois as amostras que o ser humano nos anda a dar, não só de hoje pois já vem tudo de muito longe, não justificam que nos inquietemos pelas más acções que saem permanentemente das obras do Homem, essa tamanha amargura que eu vou acumulando não justifica que, pelo menos no meu caso, continue a dedicar atenção a tudo que se movimenta ao cima da Terra.
Eu julgo saber (tenho sempre dúvidas) que este estado de alma é caso que merece a ajuda de um psiquiatra. Talvez essa parte da ciência possa fazer alguma coisa de benéfico, no sentido de me afastar dos pensamentos e das observações que me colocam neste estado de apreensão. Que o dedicar-me aos meus quadros, aos meus poemas, à literatura pura e simples, sem ter de intervir nas ocorrências que, quer em Portugal quer em todas as civilizações que, cada vez mais, utilizam as novas tecnologias para provocar desentendimentos sucessivos entre os que se mantêm vivos e que julgam que a morte nunca os atingirá, que o encafuar-me na minha própria personalidade, o isolar-me dos problemas terrestres me pode transmitir alguma serenidade, eu imagino que uma recomendação deste tipo dada por quem é fiel seguidor dos princípios psicológicos talvez me retire parte desta angústia. Só que o pior é que, no que me diz respeito, o olhar para dentro, o contemplar-me, o avaliar aquilo que sou e o que valho, o panorama que se apresenta não é, de forma alguma, muito agradável. Não fico embevecido.
E ao acompanhar o que se passa neste nosso País, depois de ter suportado na pele o que foi antes, com conhecimento das partes tristes da nossa História que se procuram em ocultar e que os feitos heróicos não compensam, ao não poder ignorar o que, depois da Revolução e nesta altura concreta, tem vindo a desenrolar-se, é, francamente, entusiasmante ser-se espectador e, sem querer, participante?
Depois de 80 anos de vida, ela própria muito activa, recheada de acontecimentos que não são normais nos cidadãos comuns, tendo visitado mais de 60 países, sempre profissionalmente, com actividades de responsabilidade, com sustos e alegrias, sempre com a preocupação de manter o sentido de ética e de bom comportamento, ainda que consciente de que nem sempre esses objectivos foram completamente atingidos, chegado a esta altura teria aspirado contemplar tudo que me rodeia, quer no meu próprio País quer no espaço lá fora, pois aquilo que me é dado assistir é a uma amálgama de más criaturas, de gente que tem como única preocupação o seu bem estar próprio e que não hesita em sacrificar o próximo para tal obter.
E, só de passagem, ao ter ouvido hoje que o Bastonário da Ordem dos Advogados garantiu, perante as televisões, que o julgamento do caso Casa Pia vai acabar por prescrever, então face a esta pouca vergonha há ainda alguém que admita valer a pena insurgirmo-nos em Portugal contra as patifarias que cá ocorrem?
De facto, como já ouvi dizer, este nosso mundo seria um enorme aborrecimento se todos os seus ocupantes fossem boas pessoas, se não provocassem conflitos, se não houvesse zangas, se a luta pela melhoria de vida de cada um não tivesse que ser uma constante, se a inveja não existisse, se a maldade figurasse apenas nos livros dos maus exemplos. Tal como nos comportamos, pelo menos, sempre se divertem os que sentem prazer com o mal dos restantes, sobretudo quando há os que saem vencedores dos encontrões que dão aos outros.
Será assim. Mas eu já não consigo continuar a assistir a um tão triste espectáculo. Já fui actor demasiado tempo e protagonista involuntário, pois apenas assistente, em muitas dessas cenas. Tenho direito a ter a minha angústia, sobretudo se não me resta outra alternativa que não seja o de também fazer parte desta imensidão de más feitorias.
Em todos os momentos penso neste dilema. E, como não sou excepção e não posso deixar de sentir a tal inveja corrente, arrepelo-me ao contemplar aqueles que não param para pensar e que tudo que ocorre lhes é indiferente! … Pelo menos terão, isso sim, uma dose de felicidade muito mais elevada do que aquela que eu gostaria de ter. Só que ninguém é senhor de escolher as suas formas de sentir.
Vamos a ver quanto tempo me aguento nesta posição de amargura. Recuso-me a ler o que escrevi. Certamente arrepender-me-ia e por isso não olho para trás.

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