sexta-feira, 12 de março de 2010

CAVACO DIZ...


A ENTREVISTA que o Presidente da República concedeu à RTP, por sinal a segunda ao longo da sua condição naquele lugar, tendo sido aguardada com compreensível interesse por se tratar de uma período que muito está a preocupar os portugueses, depois das suas respostas terem sido digeridas pelos que acompanham as evoluções da nossa vida política e social e de os comentadores habituais terem divulgado os seus pareceres, há que, cada um por si, tentar extrair das afirmações dadas a Judite de Sousa – por sinal, uma boa profissional nesta área – o que for importante para se concluir o que estará na cabeça de Cavaco Silva, já que é ele que tem a responsabilidade de procurar equilibrar as várias frentes que, cada uma no seu lugar, defendem os seus respectivos pontos de vista.
Pois bem, também me cabe o direito de deixar neste blogue aquilo que pude interpretar das palavras que o locatário de Belém quis que passassem para a opinião pública.
Em primeiro lugar, não indo ao ponto de tentar adivinhar se existiu qualquer estabelecimento de acordo quanto às perguntas que iriam ser postas, o que, como profissional antigo da comunicação social, não desejo admitir – pelo menos, nos múltiplos encontros de entrevistas que tive, em várias partes do mundo e com diferentes personalidades, nunca me foi posta essa condição, que eu, obviamente, não aceitaria -, tenho de reconhecer que Cavaco Silva trazia o trabalho de casa bem decorado. E as respostas que deu às perguntas da entrevistadora revestiram-se sempre de um cuidado extremo em não ferir susceptibilidades nos vários sectores que se encontram de costas no panorama de confronto que se verifica em Portugal nesta altura.
Para além de se ter mostrado pouco crédulo no que diz respeito ao Governo afirmar que desconhecia o negócio que se estava a preparar entre a PT e a TVI, não foi muito além dessa dúvida e antes procurou transmitir a ideia de que, ao contrário do que se anuncia por vezes, as relações entre ele e o primeiro-ministro são absolutamente institucionais, que é a forma melhor de dizer que não existem divergências graves entre ambos os comportamentos.
Em resumo, portanto, o que se tem de concluir das afirmações do Presidente é que, por sua iniciativa, não se deve esperar que o Governo venha a ser demitido, pois não omitiu que tais atribuições cabem, em primeiro lugar, ao Parlamento e é este que tem a incumbência de fiscalizar as acções e de votar uma moção de censura. Se isso não aconteceu, a ele só lhe cabe estar sem interferir, disse.
Numa palavra: a ideia com que eu fiquei desta entrevista é que Cavaco Silva, embora diga que falta muito tempo para dar a conhecer se se recandidata ao lugar, este foi o primeiro passo para deixar os portugueses seus partidários descansados quanto à sua vontade em repetir as funções.
Resta agora aos adversários já anunciados quanto a conquista da Presidência da República, ou os que venham, por ventura, ainda a surgir, tomarem as posições que considerarem mais convenientes para fazer frente ao que já está a preparar-se para permanecer no posto.
Afinal, também não é por aí que o Pais se defende melhor ou pior das avalanchas que poderão surgir para complicar mais ainda a situação de crise que nos atormenta e que não vai ficar por aqui, com PEC ou sem ele, já que o que surgiu neste documento do Governo não parece ser suficiente para remendar os buracões que foram criados ao longo de um passado que chegou até aos nossos dias e que, esse sim, deveria ter sido levado a cabo com precaução, bom senso, sentido das realidades, limitação das condições financeiras e sociais que estivemos a viver, ao contrário de umas partidas de mau gosto que uns tantos nos quiseram pregar. E, sobre isso, o Presidente não quis adiantar nada que pudesse sobressaltar as hostes, embora haja que reconhecer que tem de haver todas as cautelas no sentido de não se deitarem achas para a fogueira, pois que já nos chega ter de suportar as consequências de uma crise mundial que, não há que escondê-lo, da parte portuguesa teve o acréscimo de uma má governação. No entanto, ainda que enfrentando esses riscos, de um Presidente sempre se espera, particularmente quando as coisas não estão a correr de harmonia com as necessidades nacionais, que, sem ir às últimas consequências, dê mostras ao País de que não se encontra conformado com os erros mais evidentes que tenham sido tomados pelo Governo em exercício. E isso não foi presenciado na referida entrevista.
A História, se houver quem a queira escrever com independência, contará toda a verdade, para que os vindouros, especialmente os que cá estiverem para pagar as favas, apontem os dedos acusadores e tentem encontrar uma saída para a herança que lhes é deixada.
Nesta altura em que termino este texto, ao fim da tarde, ainda no Parlamento não foi votado o Orçamento. Mas, é mais do que certo que o mesmo passará, com as habituais abstenções de quem não se quer comprometer nem com o sim nem com o não. Dizer mal, pois sim; comprometerem-se, isto está quieto!

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