quarta-feira, 9 de abril de 2008

DESENCANTO... POR ENQUANTO!


Quando me sento à frente da televisão e ocupo algum tempo de tédio a ver algum programa que pretende ser de divulgação da cultura, desses que são chamados de concurso com prémios, acabo sempre por ficar triste, como se estivesse à espera de assistir a concorrentes que não desconhecem aquilo que se aprendia até na antiga instrução primária. A de outros tempos, em que se faziam exames de terceira e de quarta classes e depois de admissão aos liceus.
E essa tristeza que nos provoca o espectáculo, tanto o que surge por parte dos concorrentes como do lado de quem redige os questionários. Ambas as partes são dignas uma da outra. E os telespectadores têm de suportar uma revoltante amostra de incultura. Os concorrentes, quer se trate de gente jovem quer de adultos, fazem prova de que Portugal atravessa um período aflitivo de grande falta de cultura. Desconhecem o mais básico, seja qual for o tema que esteja em jogo. Mas, por outro lado, as questões postas, na sua maioria são relacionadas com o mundo da música moderna e do cinema, mas sobretudo no que se refere a nomes de intérpretes e a relacionamentos familiares dos mesmos. Foi aquilo a que assisti num desses concursos em que o apresentador não se distinguia do baixo nível do conjunto. Usava a língua portuguesa com total descuido e abusando de expressões feitas e descabidas do diálogo que mantinha com os presentes. Lembro-me que permanentemente utilizava a expressão “digamos”, sem vir a propósito e sem caber na frase.
Aflige ter de concluir que somos um País em que a cultura, mesmo a mais mediana, se esvaziou no período de transição entre as gerações anteriores e a que hoje tem a sua oportunidade de mostrar o que vale. Não há que fazer a apologia da época de ensino em que se tinham que papaguear as estações de caminho de ferro, os rios e os seus afluentes e era obrigatório dividir as orações dos Lusíadas. Mas eu, por exemplo, ainda sei recitar de cor todas as preposições. E dá-me algum jeito!
Fico a pensar no futuro deste País. Não se trata já de sermos capazes de solucionar os problemas económicos que nos sufocam hoje em dia, mas também nos anos que se aproximam e em que a juventude de hoje, essa que não sofreu as agruras de uma ditadura que durou décadas, gozando agora os efeitos da liberdade que não sabe aproveitar porque a confundem com libertinagem, com soltura desregrada, ausência de responsabilidade, clamar só por direitos e esquecendo os deveres, essa gente nova nesta altura será a que, no momento próprio, terá de enfrentar as dificuldades que espreitam.
Nós, os que vivemos o antes em pleno e atravessámos a Revolução com a alegria e o desassossego provocados pela mudança, que conhecemos o que é viver nas duas situações, estaremos mais habilitados a avaliar os maus comportamentos daqueles que correm o risco de estragar o bem que encontraram quando nasceram.
Hoje, não se estuda capazmente, trabalha-se mal e o menos possível, apela-se por tudo e por nada aos subsídios do Estado, foge-se o mais que se pode ao pagamento dos impostos, sem os quais não há Estado capaz de fazer frente às suas obrigações, não se cumprem rigidamente regras e legislações, sempre à espera de um descuido das autoridades, numa palavra, perdeu-se a noção do que é ser um bom cidadão.
Tão mau como tudo isto que acabo de referir é a outra face da moeda. È que as instituições governamentais, aqueles que têm a responsabilidade de, periódica ou episodicamente, comandar as massas, essas, por um lado porque a situação atingiu tão baixos valores que a solução não estará ao alcance só de boas vontades e também porque as oposições, os sindicatos, os que são atingidos pelas medidas impopulares, todos esses utilizam todos os meios para denegrir a acção dos que estão a governar. E, verdade seja dita, será necessário actuar muito mais depressa e com medidas ainda muito mais severas.
Enquanto se vive neste panorama, assiste-se ao reaparecimento de grupos juvenis de novos fascistas, de início na própria Alemanha, mas depois, mesmo que em pequeno número, até portas adentro, ainda que, felizmente, em escala reduzida. Se faço este desabafo é porque tenho o direito de me preocupar por ser possível, de novo, por culpa daqueles que, por não saberem conservar as partes boas do que têm, contribuem para uma mudança que, de novo, pode apenas dar bom lugar aos oportunistas das revoluções.
Quem atingiu já a idade que não dará para chegar à altura de grandes mutações políticas, por si estará descansado. Mas, e a criançada de hoje? Os homens de amanhã? O que os espera?

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